TRAIÇÃO FIEL

Todos nós precisamos de alguém do gênero oposto, que não seja cônjuge ou amante, mas em quem possamos confiar como não confiamos em mais ninguém. Nem mesmo em nós. Uma pessoa que amamos de forma separada, especial, como não saberíamos explicar ao próprio espelho. Muito menos a quem devemos explicações formais.

Jamais seremos completos, não havendo essa pessoa para quem podemos expor o íntimo, as nuances d´alma, os medos, conflitos e fraquezas, sem o contexto banalizado das relações discutidas . Tirar a máscara e também a roupa, ganhar colo, trocar carinhos e confidências, mas não deixar que a beleza dessa mais que amizade caia no lugar-comum dos romances instituídos que todo o mundo já tem.

Temos que ter esse alguém cujo laço é preciso esconder, pois o mundo não teria olhos nem coração para entendê-lo. Precisamos desse pecado santo. Dessa infidelidade sem pecado. Dessa traição fiel que não faz sofrer nem corrói os laços obrigatórios de uma sociedade cristalizada que não sobrevive sem suas faixas e formalidades.

Trata-se de um tesouro afetivo. Quase ninguém tem, porque se proíbe, não acredita quando acha ou transforma no que não pode ser. Hoje posso gritar para mim mesmo, como aquela criança que se vangloria perante as outras por ter um bem pessoal que todas ambicionam, mas no seu meio, ninguém mais possui: "Eu tenho! Você não tem! Eu tenho! Você não tem!".

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 12/02/2014
Reeditado em 12/02/2014
Código do texto: T4687901
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