Gatinhas do mal II: empatando o jogo

Oi caros 23 fiéis leitores e demais 36 de quando em vez. Hoje retomo a história das gatinhas. Um pouco mais cedo que o normal (17h19min), por motivos de força maior.

Caía a tarde e as gatinhas lá, resistindo bravamente ao meu cerco, enfiadas no forro. Bom, se eu perder para essas gatinhas, com quem empatarei?

Decidi mudar de tática e busquei a gata preta no calabouço, a fim de usá-la para desentocar suas crias, eis que já deveriam estar sedentas e com fome. Subi na escada metálica de abrir e coloquei a gata sobre o telhado. A danada não queria ficar lá e desceu pelo muro dos fundos, que é alto e fica à uns 40 centímetros do telhado da área de serviço.

- Mãe desnaturada!

Nova tática, infalível: Whiskas sachê. Coloquei no canto do telhado e novamente botei a gata lá em cima e, agora, ela ficou. Afastei-me uns dez metros e fiquei campanando. Não deu outra, as gatinhas surgiram e correram para sua peluda genitora.

Sorrateiramente, dei a volta e contornei a área de serviço, subi pela escada de madeira que havia deixado estrategicamente posicionada perto da entrada para o forro e, com uma camiseta velha, comecei a tapar o pequeno buraco. Foi elas me verem e voltaram correndo, em vão. 1x0 para este Bacamarte.

Uma delas, a mais arisca e arredia, avançou e, reconheço, corajosamente, enfiou a cabela entre a camiseta e a minha mão, tentando desesperadamente impedir meu intento. Apartei-a utilizando o pequeno sarrafo com o qual empurrava a camiseta embolada para firmá-lo bem no local. Ela voltou ao ataque. Foi um átimo para minha admiração se tornar irritação e dai para raiva da bichana: instintivamente, pressionei leve mas firme com a ponta retangular do sarrafo a gatinha pelo pescoço, contra a parede. Ela acusou o golpe, debatendo-se e berrando, mas mantive a posição até firmar bem a camiseta na entrada, mesmo sentido-me um canalha.

Terminada a tarefa, soltei a gatinha e ela voltou para junto das irmãs e da mãe que, por seu lado, observavam tudo impassíveis, como se não fosse com elas. A Arisca (resolvi no ato que esse seria o seu nome), entretanto, lançava-me um olhar de ódio mortal, presumo, pela cara dela, mas não se atreveu a vir novamente onde eu estava. Fosse ela uma leoa e eu estaria, com certeza, morto. Só que na natureza o que vale é a lei do mais forte e mais inteligente, no caso, eu. Fiquei tão contente de ter enganado as gatinhas do mal que liguei para a Louise, que estava no mercado, para contar.

Desci da escada. Que ficassem ali agora, ao relento, a noite inteira. No outro dia eu recolocaria no calabouço a gata preta, retomando o cerco, e aí a gente iria ver quem manda nesse terreno.

Por volta das 20 horas o tempo armou e caiu um temporal. Confortavelmente acomodado dentro de casa, lembrei das gatinhas. Putz, minha consciência pesou.

Sabia que na junção dos telhados havia uma pequena sobra do da casa, aonde elas poderiam se abrigar caso a chuva não estive vindo diretamente na direção delas. Verifiquei o sentido do aguaceiro: não ia de encontro às gatinhas. Todavia, batia muita água e minha preocupação aumentou, já que a temperatura caíra de supetão. Tá certo, essas gatinhas eram do mal, mas eram pequenas, se se molhassem demais passariam frio durante a madrugada e, tal soma de fatores, com grande chance, as adoeceria fatalmente. Senti-me um tremendo idiota. Quando a gente toma uma atitude qualquer e não pensa bem nas suas consequências, podemos acarretar consideráveis prejuízos aos outros.

Bom, deve, tem de pagar: coloquei uma capa de chuva, calcei havaianas, calção de nylon, peguei a escada de madeira e, abaixo d'água, fui lá ver, no escuro, como estavam aquelas criaturinhas. Para minha sorte, a chuva amainou um pouco.

Subi, iluminei o local com o celular e as vi, amontoadas à entrada do buraco, encostadas na bucha feita com a camiseta. Comecei a afastá-las para conseguir retirar a camiseta. A última, que, desconfio, fosse a Arisca, não queria sair de jeito nenhum. Tive de enfiar a mão e puxá-la firme pela cabeça, atormentado por seus escandalosos urros de descontentamento. Todavia, contra a força bruta não há resistência.

Foi eu liberar a entrada e as felinas se acomodaram no mesmo local e, percebendo a passagem liberada, não titubearam. Só a chata da Arisca não entrou, ficou encostada no canto da parede. Nojenta, toda ferrada e ainda pagando uma de arrogante, fazendo-se de difícil. Como estava fora do alcance de minhas mãos, tentei, com o sarrafo, conduzi-la para a entrada do forro.

A cadela correu para o centro do telhado e ficou lá, na chuva, que mais uma vez diminuíra.

- Ok, você venceu Arisca, 1x1.

Voltei para dentro de casa, tomei um banho e fui dormir. Amanhã será um novo dia e eu acharei uma maneira honrosa e respeitável de dobrar aquelas gatinhas do mal e vencer o jogo que, na moral ,elas haviam empatado.

PS - Sabem onde estava a gata preta enquanto tudo ocorria? No calabouço, dormindo.

- Mãe desnaturada!

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Era isso pessoal. Toda sexta, às 17h19min, estarei aqui no RL com uma nova crônica. Abraço a todos.

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(Não sei porque eu ainda coloco o link desse blog, eu perdi a senha e não atualizo ele há séculos. Até eu descobrir o motivo pelo qual continuo divulgando esse link, vou mantê-lo. Na dúvida, não ultrapasse, né. Em 2015 talvez eu dê um jeito nisso... Mas acho que continuarei seguindo o conselho que a Giustina deu num comentário em 23 de outubro de 2013.)

Antônio Bacamarte
Enviado por Antônio Bacamarte em 24/04/2015
Reeditado em 13/11/2015
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