PAI CHÃO

Pai algum quer louvores do filho amado como condição para zelar por ele. Ama os filhos na igual medida, o pai reincidente... faz tudo pelo bonzinho e pelo rebelde, pelo que acredita e pelo que duvida. Vive dando ao que pede, ao que não pede - até mesmo ao que rejeita - o que tem de melhor para oferecer.

O bom pai não dá livre arbítrio ao filho, se for para se drogar, prostituir-se, cair na marginalidade. Concentra todas as suas forças não em simplesmente esperar a volta do filho pródigo, mas em resgatá-lo, se preciso à força, do chiqueiro de uma vida indigna e de misérias. De uma saga de vício e perdição.

Filhos não precisam se curvar aos pais pelo perdão. Nunca têm que louvá-los, dedicar-lhes hinos, oferecer holocaustos, fazer promessas, satisfazer suas vontades nos mínimos detalhes. Pai não quer elogios, enaltecimentos, contrições, rezas, reconhecimentos e rituais de obediência cega, indiscriminada e solene.

A presença paterna é de corpo e alma. Ele pode ser visto e tocado. Sua graça é clara e patente, haja fé ou não. Se não tem todos os poderes, usa todos os que tem a favor dos seus, independente dos méritos de cada um.

Filho sabe que pai é pai a qualquer custo. Nunca será somente criador. Sendo assim, filho jamais será somente criatura, faça o que faça ou deixe de fazer. Nada se cumpre obrigatoriamente pela deferência paterna, pois ela nunca "sente muito" ou "deixa para lá", quando a escolha filial é infeliz.

Nenhum pai livra um filho e deixa outro, nem dá vitória a esse negando àquele. Jamais indefere o do meio, deferindo o caçula ou primogênito. Se é limitado ou onipotente, sempre é para todos. Não ordena uma hierarquia nos domínios do amor, estabelecendo quem faz ou deixa de fazer jus.

O pai morre sempre na cruz pelo filho, e faz isso ele mesmo; não tem coragem de sacrificar um em favor dos demais. Vai morrendo e vivendo sem ascender aos céus para assistir ao resultado e definir merecedores. Depois disso não lança ao rosto, e quer seus filhos felizes - reconhecendo ou não seu sacrifício diário, acreditando ou não na força do seu sentimento, até mesmo na sua existência como pai que sempre será.

Repito ser provável que um pai, por ser humano, não possa tudo por um filho. Mas é tudo o que pode, podendo ir além. Ele nunca se nega como tal, e sabe ser infinito no espaço de sua finitude. Dentro de suas possibilidades inexiste o impossível, se for pelo bem de um dos seus.

Quem tem o amor - amor mesmo! - de um pai, não precisa do condicional, seletivo, conveniado e burocrático amor desse Deus arbitrado pelas greis...

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 18/06/2007
Reeditado em 08/10/2010
Código do texto: T531840
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2007. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.