Lado max da internet

João Pedro, orgulho da família, tinha a cara do Bill Gates. Diante da preguiça e jogando xadrez contra o computador avaliava o desenvolvimento das novas técnicas: violão, telégrafo, rádio, toca-discos, gravador, televisor, computador, etc. Avaliava o quanto tais artifícios tomavam o seu mundo interior. Havia mudado muito, era preciso encarar as transformações.

- “Há muita gente jovem na Cidade dos velhinhos em Jacarepaguá!”, lhe disse, como pai em tom de máxima. Use-a como senha! Sabia que a frase era grande demais. O humor foi o modo de quebrar o gelo. O filho era o demônio, demo com aquele vermelho rasgado do sol na terra seca. Estava naquele período longe da Estrada da Confiança, que o adolescente apresenta à guisa de independência. Quem viu João Pedro naquele tempo? Os bons tempos em que Dada Maravilha era o verdadeiro torpedo.

Não custou a imaginar que estaria a ponto de se abandonar quieto e lírico aos prazeres da internet. Seu segundo enxadrismo. João Pedro era um navegador afortunado. Antes os moleques jogavam bola e viravam craques, depois tudo mudou. Veio asfalto, mais industrialização, mais avanço, mais tecnologia. Hoje os moleques jogam torpedo pelo celular.

Sabia que ele estava fazendo a opção certa. Era uma bela máquina com trilhões em memória. Decerto se encontrava diante de algo que lhe daria 685% de avanço. As damas do xadrez poderiam não ser as sereias da praia, mas podiam fazer gols em compra e venda. Cedo ou tarde João Pedro estariam percebendo grandes louros financeiros com a nova máquina. Vendendo bem as sereias abrolhariam do entusiasmo. O incomensurável investimento de tempo deveria levar ao lugar desejado.

Se errasse a medida monetária sobreviriam heranças de quem era testamentário. Se morasse numa casa simples talvez fosse tarde demais para mudar de vida já que estava navegando dez horas por dia.

- Por onde João Pedro tem andado?

Anda pela casa ausente. Pega o jornal, lê. Liga a Tv. Desliga e passa para a Internet. Deu adeus aos Beatles e Rolling Stones no volume mais elevado da audição. Sim, ele mudou, mudaram as referências. Já não assobia Eleanor Rigby. Pratica a poligamia virtual. Possui trinta e sete namoradas absolutamente virtuais. A paulista que mora em Roma reconta histórias de viagem diante da cratera de vinho pela web Can todos os dias. Nesse sentido ele acessa a muda nostalgia. João Pedro em casa, ela em Roma.

Já Elizabete é moradora na rua da imaginação, travessa D. Brigou com João Pedro porque descobriu novos recados tolos e virtuais. Hoje ele segue navegando pelo carnaval gráfico das páginas coloridas a cada clique informal.

Tenho alertado minha esposa de que o coitado está desaprendendo a falar novamente. Ler calado já lia. O que não consiste em defeito. Agora “falar sem falar” é a revolução do novo tempo. Falar sem dizer nada. Dizem que foi Santo Agostinho quem primeiro leu sem movimento labial, ele ficaria espantado com a novidade.

Os casos são muitos. Uma vez confessou sobre a conversa que teve com uma moça. Perguntou-lhe como estava vestida, ao que ela respondeu: de cuecas!

Pois esse não saber perfeitamente o tempo real mistura-se às coisas sérias numa fração de segundos.

Tércio Ricardo Kneip
Enviado por Tércio Ricardo Kneip em 08/08/2007
Reeditado em 09/09/2011
Código do texto: T598483
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