RELATÓRIO QUASE SUCINTO


Diário  de  minhas  andanças
14/Agosto/2010



Brrrrrr!...Como faz frio por aqui,gente boa!
Já passam de 18 horas e atrevo-me a convidar a Polaca para a caminhada da tarde.A resposta me vem curta e objetiva:
-Eeeuu?!...Nem pensar...Vai você "que tem o mal do bicho carpinteiro",não sossega nem com um frio dêstes...
Na verdade eu já conhecia a resposta,maass...Uma médiazinha na tarde de sábado pode render bons resultados ao cair da noite,penso cá com meus botões.
Tô indo!...Imagina se um friozinho mixuruca de 2 ou 3 graus vai lá me fazer medo.
No melhor estilo repolho (camiseta,agasalho,japona,cachecol e...Luvas de lã,novas,numa cor que não combina com a jaqueta,mas...são novas!) estou em frente de casa e prêso agora a uma dúvida cruel:Que rumo tomarei?
À minha direita,a nova pista de caminhada convidando-me à caminho do centro.Ascendem-se as luminárias modernas e há uma considerável circulação de pessoas no trajeto.
À minha esquerda,a reta que parece não ter fim,lança-me um olhar lânguido e um convite a dar uma espiada nos contornos da serra da Esperança,nas luzes da Unicentro,no bucolismo das araucárias...E,de quebra,se tiver sorte vislumbrar um trem contorcendo-se,apitando e deixando-se engolir pelo viaduto.Além,é claro,daquêle cheiro de bolo de fim de semana e "Melody Fair" dos Bee Gees,numa daquelas casas antigas da rua Guatemala.Porque nâo?...Afinal,num sábado tudo é possível!
Escolho a segunda opção,e...vou andando.
A tarde é de uma beleza ímpar!...Dante,Giustina,Tânias e outros amigos sulinos,haverão de convir comigo de que as noites que antecedem as manhãs de geadas são fascinantes.Um céu colorido em ternos matizes,vapores e neblinas erguendo-se lentamente pelas "canhadas",fumaça de chaminés desenhando espirais aqui e acolá...
Mal atinjo a segunda quadra e cruza por mim um grupo de jovens senhoras evangélicas.Os saltos altos fanfarream um plac.plac...sêco e o asfalto inunda-se de perfumes femininos delicados e sensuais...Seguem com seus charmes,bolsas e bíblias...Na esquina,em frente ao templo,um grande número de irmãs e irmãos,aglomeram suas elegâncias à espera da chegada do pastor.
Do outro lado da rua,os "bares dançantes! da Tônia e da Tigrinha",esganiçam o breguismo de suas canções boêmias à todo volume...As meninas,bem produzidas,expõe suas beldades "encazacadas",numa sugestão de que a noite ,ainda que gelada,promete!
De um lado,o templo da fé.Do outro os templos da devassidão,reflito!
E o bom senso,puchando-me as orelhas,alerta-me:
-Fica na tua,bisbilhoteiro!...Tu não tens nada com isso.
Prossigo...A tarde vai caindo rapidamente.Cruzo com tantas pessoas.É um tal de:Oi!...Tudo bem?...Como vai?....E outras cositas do gênero,tão peculiares à quem vive no interior.
Minhas orelhas estão geladas.Embora o vento de inverno recolha-se em sua covardia quando a noite chega,deixa de quebra a sensação térmica que faz gelar orelhas,nariz e ponta dos dedos.Completo o meu trajeto,dou uma paquerada nos contornos da serra,um pequeno descanço no gelado banco de granito e tomo o caminho de volta.
Algo me incomoda.Preciso "dar uma aliviada".Diuréticos são implacáveis.Fazer o que?...É Noite!...E a noite é dos enamorados,dos poetas e...dos mijões.Sigo uma pequena trilha de mato à beira do asfalto.Um vai e vem de carros e luzes faz-me adentrar um pouco mais longe do acostamento.
Ah!...Que alívio!...Olho para o céu.A noite translúcida! Uma lua nova desenha uma vírgula de prata e de quebra uma estrela cintila bem proxima daquela curva.Vislumbram-me pelos desvãos dos fios da rêde elétrica.Fico encabulado.Mas sei que as donzelas lá do alto devem entender o suplício de quem faz uso dêstes inconvenientes comprimidinhos.
Bem mais leve,agora,estou novamente no trecho.
Surge à minha frente,uma figura que me parece surreal.É de estatura mediana,gorducho,usa chapéu de abas largas com barbicacho.Vem enfiado num Poncho de lã e o ruído das botas é quase ensurdecedor.
Ao cruzar comigo,cumprimenta-me assim:
-Buenas...Tchê!...Frio pra mais de metro,guri!,não achas?
E a mim,só me resta incorporar um gauchão.Então lhe respondo:
-Mas,Bah!...Vivente,que um frio dêstes requer um bom "cobertor de orelhas",no mas!...
Caímos na risada e cada um toma o seu caminho.
Meu retorno se dá num clima de alegria,vou arquitetando umas idéias para aquecer e quebrar o gêlo da noite.
Amanhã é domingo,e pode-se acordar lá pelo meio dia.Mas,se o bicho carpinteiro manifestar-se é possível que eu saia pisando gêlo pelas quebradas na minha caminhada matinal.
Voltarei para um novo relatório no caso da ocorrência desta proeza.
Abraços sulinos a esta gente querida do Recanto.
Joel Gomes  Teixeira

Comentários:


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25/01/2011 01:53 - Alice Gomes
Esta foi a descrição poética mais inusitada de alguém observando a lua kkkkk - - - a lua nova e a estrela juntas marcam o início do Ramadâ. Eu me lembro que nesse dia escrevi no meu twitter: Mentes inquietas, corpos ardentes, no céu a estrela e a lua do Ramadã.


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19/08/2010 15:07 - Lisyt
Joel, suas crônicas são sempre um encanto! Este relatório me deu saudades do tempo que morei no sul. Caminhei com você nesta tarde fria, sob um céu de belos matizes, vapores e neblinas. Você pinta quando escreve. És um poeta! / Desculpe se não tenho vindo visitá-lo, mas nem sempre fazemos o que queremos. Mesmo sabendo que ler seus textos é uma forma de reabastecer minhas energias.Um forte abraço!


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17/08/2010 21:11 - Ebony Eyes
Nossa! adoravel seu relatório, cada detalhe nos faz participar e querer mais... Parabens!


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16/08/2010 19:55 - Maria Olimpia Alves de Melo
Hoje estou aqui no estilo repolho, mas bem dentro de casa. Nem morta eu saio apesar de ter o bicho carpinteiro nas pernas e pés.//Mas foi bom passear com você.


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16/08/2010 18:46 - RobertoRego
Joel, saborosa crônica que me deixa na expectativa do "segundo relatório" (rsrsrs). Bah, tchê, mas que frio danado, heim? Meu aplauso, abração e boa noite, caro poeta! ...


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16/08/2010 14:40 - Clotan
Que bela crônica...! Gostei do desenrolar dos fatos e dos termos que você usa nas expressões, dando um colorido no assunto. Muito bom mesmo bravo poeta e cá estou para lhe parabenizar... Clotan


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16/08/2010 10:52 - Dante Marcucci
É mesmo, Joel. As tardes que precedem a geada são lindas. Mas o "cheiro" de uma manha ensolarada num campo coberto de gelo é coisa que só os que viveram isso entendem. Bela cronica, muito bem escrita. Um abraço gaucho


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16/08/2010 10:51 - Dona Joana
que linda crônica poeta


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16/08/2010 00:15 - Maria Dilma Ponte de Brito
Lindo texto, cheio de detalhes, descrevendo um frio que não conheço, uma paisagem diferente do meu mundo. Fico encantada com seus escritos.


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15/08/2010 16:41 - geraldinho do engenho
Amigo a cada maravilha descrita por você aumenta minha simpatia por sua terra, como é bom este contato e esta viagem imaginaria ao teu lado. Seus textos são verdadeiras aulas de conhecimentos gerais... Fico de devendo mais esta...Obrigado pela visita e pela grande lição literária!Abraços fraternos!


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15/08/2010 10:32 -
Poeta, o que dizer depois de tamanha exposição. Cuidado com as regas, pois em algumas cidades é multa na certa,kkkk. Belíssimo texto, com sempre nos deixando uma nota suave no ar para encantar nossos pensamentos.Um abraço aconhegado nestes dias tão frios, Jane.


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14/08/2010 23:31 - Giustina
Joel, estou desconfiada que és um gauchão disfarçado! Amigo do Dante, arriscando um "Bah!" e ainda sujeito a virar picolé numa passeada noturna... só gaúcho mesmo! Eu "vi" todo o cenário, cheguei a sentir o frio na orelha! Mas não te "aperreies", pois fechei os olhos na cena do matinho... rsrsrs. Cada vez mais sinto falta quando não venho te ler. Bom domingo, amigão.


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14/08/2010 22:17 - Anita D Cambuim
kkkk então caminhas e regas plantinhas...rs...Boa noite!


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14/08/2010 20:35 - João Adolfo Guerreiro
Também faço essas caminhadas. Rica é a vida das pessoas nesse mundo. Valeu pelo teu relato, ficou interessante de ler, além do teu estilo de escrita ser agradável.