HÁBITO DE OUVIR RÁDIO

HÁBITO DE OUVIR RÁDIO

Nem só de escrever vive o homem, mas de qualquer outra coisa, seja um dom, uma vocação, um entretenimento, porém, que seja algo que tenha um gosto especial e que faça parte constante da própria vida. Eu, por exemplo, gosto muito de ouvir rádio, sempre gostei desde criança. O rádio é um veículo de comunicação antigo e popular que jamais perde a sua útil modernidade. E é tão prático que se pode ouvi-lo em qualquer lugar. Difícil de se imaginar uma casa sem um rádio. Pode nela faltar qualquer coisa, menos um rádio.

Eu ouço rádio desde criança porque meu pai nunca ficou sem um rádio em casa. Me habituei a ouvir através dele, portanto, vem de meu pai, o hábito saudável de ouvir rádio. A rádio mais popular e de maior alcance (nem sei se hoje ainda é) no Brasil é a Rádio Globo do Rio. E meu pai, dentre as rádios existentes, não abria mão de ouvi-la e a ouve até hoje aos noventa anos de idade. A programação predileta dele no rádio é o futebol. Ah, quanta saudade de narradores de futebol que marcaram época na Rádio Globo, como Valdir Amaral e Jorge Kouri!

Quem do meu tempo, não se lembra da rivalidade que havia no Torneio Rio-São Paulo e no bem disputado Campeonato Carioca?!...Uma época em que o futebol brasileiro tinha bem mais qualidade, e os craques jogavam mais pelo amor à camisa do que pelo parco dinheiro que recebiam. Tão diferente de hoje que, a despeito de ser um negócio lucrativo pra jogadores e dirigentes e paixão e fanatismo pra torcedores, a máfia, a corrupção, a mercantilização capitalista gananciosa é que prevalece na arte admirável de jogar futebol.

Aliás, frequentar hoje em dia os estádios de futebol está ficando cada vez mais perigoso, pela tamanha violência praticada por alguns torcedores, que na verdade, ao invés de irem bem intencionados e de modo pacífico assistir ao espetáculo futebolístico, vão praticar os atos insanos de vandalismo, mediante as paixões baixas das torcidas fanáticas que agridem-se, guerreiam-se e destroem-se, não como seres humanos dotados de almas que buscam o aprimoramento moral paulatino, mas sim, como animais ferozes nos quais prevalece apenas o instinto inferior da selvageria.

Meu pai era alfaiate, e não só ouvia rádio em casa, ouvia-o também em sua alfaiataria, na qual, durante o seu ofício de fazer terno, calça, bermuda, e alguns consertos, se entretia ouvindo a programação local das rádios de Itabuna, dentre elas, as pioneiras Rádio Clube, Rádio Jornal e Rádio Difusora, que, avançando no tempo, existem até hoje, exceto a Rádio Clube, que passou a chamar-se Rádio Nacional. Quando meu pai chegava em casa meio-dia, antes de ocupar-se em tomar banho e almoçar, ele se sentava numa cadeira que ficava no corredor perto da porta de entrada, para fazer contas ou pensar em coisas vinculadas à profissão, e durante esses instantes de descanso do serviço matutino, ele aproveitava pra ouvir a resenha esportiva e o programa informativo do polêmico radialista Lucílio Bastos, hoje em um lugar chamado de eternidade, como diria o jornalista itabunense Eduardo Anunciação, que também já está nesse mesmo lugar.

Houve uma época que, eu ainda menino, vi meu pai expandir a profissão, ou seja, além de receber os tecidos dos clientes pra serem confeccionados manualmente, através da agulha, da linha, do dedal, da máquina de costura e do ferro de passar as roupas prontas, ele almejou igualmente comprar roupas pré-fabricadas pra revende-las na alfaiataria. Naquela época, as pessoas gostavam de vestir roupas feitas sob medida, e a profissão de alfaiate era lucrativa. No entanto, o hábito de comprar roupas prontas, passou a ser uma opção prática, não só pra quem quisesse adaptar-se à novidade de vestir-se, mas sim, porque seria também uma alternativa de ganhar dinheiro comercializando-as. E pra alcançar esse novo objetivo profissional, ele teve que ir a São Paulo.

Tomou um empréstimo no extinto Banco Econômico e viajou pra Sampa, objetivando concretizar o novo empreendimento. E prometeu-me, o filho primogênito, trazer-me como presente, um radinho de pilha. Jamais esqueci quando ele retornou da viagem bem sucedida, tão alegre, tão satisfeito pelas compras que fez. Chegou com muitas malas abarrotadas de roupas, e ali mesmo no meio da sala da casa ele abriu todas elas para que minha mãe e os três filhos vissem a variedade de sua proeza comercial. Em sua emotiva alegria, distribuiu presente pra toda família.

De repente, ele meteu a mão no fundo de uma das malas e retirou um pequeno pacote. Em seguida olhou pra mim e me disse: - Está aqui, meu filho, o radinho que prometi pra você. Já está com pilha. Pode ligar a hora que você quiser. Faça um bom uso dele e tenha cuidado, viu? - Tão contente, logo abri o diminuto pacote, e quando vi o aparelhinho de capa marrom com cheiro de coisa nova, dei muitos pulos de alegria pueril, abraçando e beijando meu pai carinhosamente. Quase sem crer ainda no presente maravilhoso que recebia, fiquei muitos dias grudado no radinho de duas pilhas pequenas ligando-o a todo momento.

O rádio naquela época era um veículo de comunicação muito prestigiado pelas pessoas, e ainda o é até hoje, e vai continuar sendo, só que antigamente as opções de informação e entretenimento eram restritas e algumas nem existiam, como o celular, o PC, o tablet, etc.. O televisor, em preto e branco, não era um aparelho acessível a todos. E o sinal retransmissor, para quem tinha o privilégio de ter uma TV, chegava de forma precária. Por isso que o rádio se destacava como uma opção de fácil acesso pelo preço mais em conta, para quem quisesse se informar e se entreter.

Minha saudosa querida mãe, que hoje já está em um lugar chamado de eternidade, também ouvia rádio e a programação predileta dela eram as novelas. Sim, porque antes, elas eram transmitidas pelo rádio, assim como os programas de auditório. Só depois é que a TV assumiu a condição audiovisual de transmitir o que só cabia ao rádio executar. O Direito de Nascer, por exemplo, uma novela que foi escrita, mas que foi proibida de ser levada ao conhcimento do público, só pelo fato do Alberto Limonta ter engravidado Isabel Cristina antes do casamento, um escândalo, uma imoralidade inconcebível à época, foi transmitida primeiro no rádio. Após alguns anos, pela liberação da censura, foi que a pecaminosa novela pode ser assistida na TV.

Alguns dons se revelam logo na infância e alguns hábitos herdamos dos nossos pais. Certamente o dom de ler e de escrever eu trago de outras vidas, contudo, herdei de meu pai e de minha mãe, entre outros bons hábitos, o costume de ouvir rádio e assistir TV. O tempo avança, as coisas se modernizam, e a tecnologia participa cada vez mais do dia-a-dia das pessoas. Com o advento da informática e da internet, que são recursos tecnológicos inovadores, todas as atividades lucram pela praticidade, rapidez e precisão concernentes aos inúmeros objetivos específicos as quais se destinam, sobretudo, quando esses recursos se ocupam em auxiliar essas atividades para promover o bem-estar existencial.

Assim como o jornal, a TV, o celular, a revista, o livro, etc, o rádio é e será sempre um veículo de comunicação de essencial relevância na vida diária das pessoas de todas as classes sociais, pelo seu valor informativo, instrutivo, educativo e cultural. Eu sempre gostei da palavra falada e escrita e tenho acesso diário, por hábito saudável, a todos os meios que a expressam. Agora mesmo, finalizando esta modesta crônica, meus amáveis leitores, eu estou ouvindo em meu rádio, a Rádio Princesa FM 96,9 (da Princesa do Sertão Feira de Santana, onde moro atualmente), que tem uma agradável programação, conciliando em sua grade o rádio-jornalismo com o entretenimento musical. Enfim, embora eu me ocupe com outros afazeres, tenho sempre algum tempo reservado pra ouvir rádio, seja fazendo alguma coisa, ou então de boa descansando sentado, deitado e até dormindo, sim, porque antes de pegar no sono, eu tenho o hábito de ouvi-lo baixinho para não incomodar a esposa que está do meu lado... E não é só eu e ela que fazemos mimos um no outro antes do nosso sono restaurador, mas o rádio, antes do nosso dormir, nos embala também.

Escritor Adilson Fontoura

Adilson Fontoura
Enviado por Adilson Fontoura em 20/06/2017
Reeditado em 05/12/2020
Código do texto: T6032371
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