BILL CHATOV, que não era americano e não devia ser chato

Boa tarde meu 23 fiéis leitores e demais 36 que de quando em vez vem tomar um café com vodka e tocar balalaika nos saraus literários desse Bacamarte. Vocês sabiam que existiu um cara chamado Bill Chatov na Revolução Russa?

Pois é, nem eu sabia. Estava lendo aqui em Charky City, a propósito do centenário da Revolução de Outubro de 1917, o livro 10 dias que Abalaram o Mundo, do americano John Reed, e eis que lá pelo primeiro quinto do livro o jornalista cita que está no Soviete de Petrogrado catando notícias para seu jornal estadunidense, às vésperas do dia 25 de outubro (data em que, pelo calendário juliano, os bolcheviques deram o golpe), quando passa Bill Chatov por ele e lhe dá umas informações.

"Bill Chatov", pensei. Um russo, em 1917, com apelido de Bill já é incomum, mas Chatov seria, no Brasil, uma piada pronta:

- Chatov, o chato.

- Ih, lá vem aquele chato do Chatov.

- Mas bah tchê, eh nome mais acertado para uma pessoa!

E por aí vai.

E também poderíamos pensar: um americano na Rússia pré-comunista? Não desconfiaram dele? Não, claro que não, né. Em 1917 o comunismo era ainda uma criança inofensiva e a Guerra Fria só se daria depois da Segunda Guerra. Então nem o Bil e nem o John Reed eram motivo de desconfiança para os comunistas, mais preocupados à época em derrubar o Governo Provisório de Kerensky e assumir o poder russo, dando uma rasteira na burguesia local.

E vejam que escrevo essa crônica pressupondo leitores que já não se embebedam na primeira vodka, pois duvido que a gurizada de hoje saiba o que foi a Guerra Fria. Não esqueçamos que a URSS ressacou em 1990, não é mesmo? E o pudim de trago de Yeltsin é que virou presidente, tudo a ver, eh eh eh eh. A Rússia virou capitalista (Virou mesmo? Sei lá! Consideremos aqui que sim, para simplificar) depois de um porre, eh eh eh eh eh eh

Tá, mas e o Chatov, Baca? Tá bom, voltemos a ele. Óbvio que eu fui pesquisar no Google, essa maravilha onde tudo se encontra (menos dinheiro). Chatov tinha o apelido de Bill porque emigrara para...

Acertou, para os Estados Unidos!

Morou por lá e pelo Canadá um tempo, trabalhando como portuário e tipógrafo. Depois que derrubaram o Czar, em fevereiro, ele voltou pra Rússia, em julho, para não perder o fervo da revolução. Da pra ver que o Chatov era um cara de iniciativa. Chegando lá foi trabalhar num jornal anarco-sindicalista. E transitava pelo Soviete de Petrogrado.

Interessante é que anarquistas e comunistas nunca foram tons de vermelho que combinassem ou se misturassem desde que Marx e Bakunin se cruzaram pela França 70 anos antes, então me surpreendeu um pouco saber das andanças de Bill pelo Soviete e, além disso, dele ter sido "Ministro dos Transportes da República do Extremo Oriente da República Soviética" em 1920. Mas como era óbvio que essa relação tinha tudo para dar errado, ele foi parar num gulag siberiano nos "expurgos" de Stalin de 1936-38. Bom, se Stalin deu cabo (precisamente o cabo de uma picareta de alpinista empunhada por Ramón Mercader) até do grande líder revolucionário comunista Leon Trotsky, no México, o que seria de um Bill Chatov anarquista em solo russo, não é mesmo?

Bom, daí as coisas se embaralham em sua biografia. Alguns dizem que morreu por lá em 1941, 1942 ou 1947. De qualquer sorte, viveu mais que o John Reed, que ficou pela Rússia e morreu de tifo em 1920, aos 33 anos. Nunca chegou perto de um gulag (bom, morreu antes de Stalin assumir o poder, né) e, pasmem, foi enterrado na Necrópole da Muralha do Kremlin, em Moscou. Isso mesmo, um americano enterrado com honras pelos comunas, vejam só. E Hollywood fez um filme sobre ele. Reds, com Warrem Beaty no papel de Reed.

Já Chatov deve ter morrido de frio, pois lá na Sibéria Stalin não mandava vodka para os expurgados.

(A propósito, eles são mencionado o mesmo número de vezes no livro de Reed: Chatov 2x2 Stalin)

É isso aí meu povo, poderia estar vendo novela, mas fico lendo e aprendendo e depois venho aqui chatear vocês com minhas "descobertas". Ficou grandona a crônica, né?

Inté. Vou tomar uma vodka.

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Era isso pessoal. Toda sexta, às 17h19min, estarei aqui no RL com uma nova crônica. Abraço a todos.

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(Não sei porque eu ainda coloco o link desse blog, eu perdi a senha e não atualizo ele há séculos. Até eu descobrir o motivo pelo qual continuo divulgando esse link, vou mantê-lo. Na dúvida, não ultrapasse, né. Acho que continuarei seguindo o conselho que a Giustina deu num comentário em 23 de outubro de 2013: "23/10/2013 00:18 - Giustina

Oi, Antônio! Como hoje não é mais aquele hoje, acredito que não estejas mais chateado... rsrrs! Quanto ao teu blog, sugiro que continues a divulgá-lo, afinal, numa dessas tu lembras tua senha... Grande abraço".)

Antônio Bacamarte
Enviado por Antônio Bacamarte em 27/10/2017
Reeditado em 25/11/2017
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