Colchão de palha .

Estava com sete anos e próximo da viagem para o Brasil, o meu pai já havia partido, minha mãe ,meu irmão e eu aguardávamos o dia do embarque na casa dos nossos avós. Uma casa pequena e sem recursos, a minha mãe ajudava nas despesas, e fazia toda as tarefas da casa, pois a mãe dela (minha avó),estava enferma , já em estado muito grave, e mal se levantava da cama, era pele e osso.

A casa deles era pequena, com dois cômodos vazados, portas de duas folhas, madeira maciça em cinza claro, e trancas de ferro. Fora , o banheiro e a cozinha anexos de um corredor ao ar livre. Uma casa muito antiga, provavelmente do século XIX, com um "hall" na entrada, que servia de recreio para nós.

À noite , lembro-me bem, o vento assobiava na janela, que ficava ao pé da escada para o terraço superior, canalizando o frio, e a cama de palha me dava uma sensação de aconchego, me fazendo pensar no meu pai longe , num mundo estranho, e no chocolate com churros da manhã seguinte. Já cansada , a minha mãe se acostava ao meu lado, me cobrindo primeiro, e logo adormecia em pensamentos.

Moramos um ano com nossos avós, mas as lembranças desse ano se tatuaram na pele, com uma profundidade que não sei explicar. Nesse período, estudamos na escola próxima, com irmãos maristas, e continuámos mantendo o contato com o mar. Bastava descer a rua que as águas e os barcos estavam lá, com seus peixes da noite anterior. Foi um dos anos mais densos da minha vida, poderia falar dele em folhas e folhas, como já fiz em outras crônicas.

O dia do embarque enfim chegou, um baú , uma mala preta e uma de mão ( que está comigo), tudo o que tínhamos , o meu pai nos aguardava em outro continente, sabia disso pelas tantas cartas e postais que ele mandava, saudoso de se juntar a nós.

O abraço do meu avô se aprisionou no peito e na minha alma, junto com suas duas lágrimas sem palavras, enquanto o táxi negro esperava para nos levar até o cais, a dez quilômetros de lá. A minha avó , em estado terminal ( morreria três meses depois), já se despedira no quarto, já não tinha forças , vinha se despedindo aos poucos desde que a conheci.

No cais, o barco branco nos esperava !

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 29/03/2018
Reeditado em 05/04/2018
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