O nada me chama; o medo me prende.

Sentado, à noite, sozinho em seu quarto, deixado com suas dores e seus tormentos, obrigado a lidar com a percepção de que sua vida é beneficiaria da dor, exploração e morte de outros. (Des)agraciado com a percepção de que a exploração do humano pelo humano enche-o de privilégios, e de que, a única opção possível, a revolução, está longe, invisível aos olhos e ao coração. Lágrimas caem de seus olhos e éle só pensa em uma forma de fazer essa dor que o consome parar. Soca a parede, de novo, de novo, de novo, sua mão começa a doer, o nó de seu dedo médio a inchar, soca novamente, desta vez sua mão trava centímetros antes, seu coração ainda está como se estivesse sido espancado, soca mais uma vez, essa tentativa requer que seus instintos de autopreservação sejam suprimidos, de novo, mais fácil, de novo, pula e segura a mão. Seu peito já está menos dolorido, ainda não é o suficiente; empurra a parte de sua cabeça que o impede de se machucar para longe e sua mão se dirige ao concreto novamente. Tenta mais uma vez, a dor na mão não o deixa repetir o ato. Se afasta, analisa o dorso, está meio inchado, imagina que seus amigos possam perceber; não se importa, talvez assim alguém o ajude a colocar essa dor para fora, antes que sua última opção seja o suicídio.

Não sabe o que fazer, a dor física já é o suficiente, mas por dentro ainda pulsa sofrimento; tenta navegar pela internet, costumava funcionar, não mais; tenta comer, não está com fome; decidi escrever sua nota de suicídio, pega seu caderno preto e registra, o coração se torna um buraco vazio. Decide ir dormir, desejando não acordar no dia seguinte, sabe que isso não acontecerá, seus olhos não descansam, fica imóvel por uns vinte minutos. Desiste. Se levanta, pega o celular, posta a nota em uma rede social e um parágrafo pedindo ajuda para alguém que nunca verá, em outra. Espera que alguém o responda, é ignorado. Desiste. Abre o Netflix, tenta dormir. Desiste. Assiste uma série, não o prende; dorme, e espera não acordar.