Publicações anteriores desta série:
  Crônicas de Brandão - Introdução
  Crônicas de Brandão - 1) O Mico da Lanchonete
  Crônicas de Brandão - 2) O Brado Retumbante
  Crônicas de Brandâo - 3) A Gincana da Torta de Maçã
  Crônicas de Brandão - 4) RRRaii RRRoberrrt!!!
  Crônicas de Brandão - 5) Putz...Melou!!
  Crônicas de Brandão - 6) Perseguindo a Polícia 


 
Crônicas de Brandão

7 – Acabou em Pizza!
 
       Brandão aos dezesseis anos tinha passado um ano na Califórnia por conta de um programa de intercâmbio. Viveu numa casa de família – pai, mãe e dois filhos – com quem desenvolveu uma grande amizade que perdurou enquanto o casal, a quem ele se referia como “meus pais americanos”, viveu até seus mais de noventa anos. Ao longo desse tempo Brandão visitou o casal por diversas vezes, o que lhe era possível em razão das inúmeras viagens que fazia aos Estados Unidos como agente de viagens, atividade que desempenhou por mais de vinte anos.

       Durante o período em que passamos juntos em Columbia, Brandão, com seu vozeirão, sua eloquência privilegiada e seu dom de interpretação gestual, divertia uma plateia de fãs brasileiras e brasileiros, com inúmeras histórias vividas no convívio da sua família americana no período do intercâmbio. Mas, uma delas era realmente muito marcante.
       
       Família de perfil matriarcal, o poder era distribuído de forma imparcial entre o gênio forte da mãe e a condescendência complacente do pai. Mas era assim que se davam bem, apesar das sempre amáveis reclamações do marido, manifestadas mais para consumo social que com a intenção de abrir mão do conforto da harmonia conquistada com a combinação perfeita de autoridade implacável de um lado e obediência irrestrita do outro.


       Foi numa viagem de recreio que fizeram, toda a família, o pai dirigindo, a mãe, ao lado, ditando as regras de percurso e de condução do veículo, os filhos e Brandão no banco de trás.  Os que conhecem esta história melhor que eu, nas suas minúcias, ou que a viveram, poderão encontrar divergências em relação a detalhes aqui relatados, o que absolutamente não macula a sua essência e nem a autenticidade de seu conteúdo cômico. Provavelmente, o próprio Brandão já a contava com algum viés retórico, enriquecendo sua hilaridade e potencializando, assim, o brilho da forma como o fazia. 

       Quatro horas já se haviam passado desde que tinham partido. Era por volta do meio dia quando a matriarca indicou a necessidade de pararem para almoçar. Devia estar faminta.  Ao longo da rodovia, vários restaurantes e lanchonetes passavam ao largo, o motorista aguardando a ordem de aportar. “É aqui”, disse a mãe incisiva, apontando uma área de descanso onde havia um restaurante. O veículo derivou para o ponto indicado. Entraram no local onde tomariam a refeição. Sentaram-se. A mãe, sem consultar os demais membros do grupo, chamou o garçom e disse: “Vamos comer pizza”!

       Em poucos minutos, já havia cinco cardápios, um em frente a cada um dos presentes, contendo uma profusão de sugestões para sabores de pizza. Sem muito refletir, mamãe indicou ao garçom os sabores de que iria consistir a pizza, tamanho grande, é lógico. Todos em silencio, a concordância foi plena; afinal, mesmo que alguém pudesse discordar da escolha, que mal haveria em respeitar o gosto da mamãe? Ou, que bem haveria em iniciar uma discussão impossível de vencer? E assim foi feito.

       Logo que a pizza chegou, fumegante e cheirosa, o garçom dirigiu-se, bandeja na mão, à senhora mais idosa do grupo, como ditam as regras da boa educação.

       - Senhora? – disse – qual sabor?

       A resposta deixou Brandão de olhos arregalados, pensando em quanto o machismo brasileiro, que os americanos criticavam com tanta frequência, podia ser tão superado pelo autoritarismo feminista exacerbado de algumas matriarcas americanas:
   
       - Nenhum - respondeu mamãe - não vou comer.... Não estou com fome.