Publicações anteriores desta série: (pesquise pelo nome do autor)
  Crônicas de Brandão - Introdução

  Crônicas de Brandão - 1) O Mico da Lanchonete
  Crônicas de Brandão - 2) O Brado Retumbante
  Crônicas de Brandâo - 3) A Gincana da Torta de Maçã
  Crônicas de Brandão - 4) RRRaii RRRoberrrt!!!
  Crônicas de Brandão - 5) Putz...Melou!!
  Crônicas de Brandão - 6) Perseguindo a Polícia
  Crônicas de Brandão - 7) Acabou em Pizza! 
  Crônicas de Brandão - 8) Louça Suja se Lava em Casa!
  Crônicas de Brandão - 9) A Velhinha de Taubaté
  Crônicas de Brandão - 10) Matusa... para os Íntimos!!
  Crônicas de Brandão - 11) Rainbow...
  Crônicas de Brandão - 12) "Pois eu d'rei q'não!"
  Crônicas de Brandão - 13) Um dia de Fúria!
 
Crônicas de Brandão

14 – Um Vilão Impostor
 
       Como agente de viagens, Brandão era o factótum de si mesmo. Seu principal produto era “Excursão à Disney World”. Projeto, visitas prévias aos locais programados, contato com os clientes, reuniões, contratações dos eventos, agendamentos, gestão de custos e preços, recebimentos e pagamentos... tudo, tudo ele fazia com o esmero de um mestre; era até mesmo o guia turístico de suas excursões. Mantinha apenas dois funcionários na retaguarda que atuavam sob sua orientação constante e minuciosa.

       Sua forma de atuar era absolutamente diferenciada e proporcionava sempre a satisfação irrestrita de seus clientes. Conseguia realizar até duas excursões por ano. Se de um lado a receita era baixa, para o alto padrão do seu produto, seus custos também o eram, permitindo uma sobra razoável.

       Era comum Brandão passar por São Paulo, no retorno de suas excursões, onde por vezes fazia escala antes de seguir para Brasília. Invariavelmente estava extenuado. Nessas ocasiões, nosso encontro lhe servia de lenitivo, de conforto e revigoramento antes de prosseguir. Tal foi a vida profissional de Bandão, com ligeiros vieses, durante mais de vinte anos.

       Em 1995, Brandão nos convidou, minha família e eu, para uma excursão aos parques temáticos de Orlando. Cobraria somente os custos. Nada além. A época era propícia para que viajássemos e a oferta bem tentadora. Viajamos a Brasília de carro e de lá iniciamos a excursão juntamente com o grupo de jovens formado pela Ícarus, a agência de viagens de Brandão.

       Entre passeios, atrações, compras, refeições e repouso, passamos cinco dias de muita diversão. Pela primeira vez presenciamos a atuação de Brandão na liderança de um grupo em excursão. Era um grande ator! Contava histórias ao microfone durante os traslados, imitando graciosamente seus personagens e mantinha a disciplina do grupo com exemplos e argumentos fundamentados na ética, no amor, no altruísmo e na generosidade. Além do conteúdo vigoroso de seus discursos, a forma como os fazia era marcante, de prender a atenção, dos mais jovens aos mais idosos.

       Tantas vezes Brandão estivera em contato com produtores, diretores e atores das atrações dos parques temáticos de Orlando e, tão impactante era seu carisma, que onde quer que chegasse era recebido com imenso aconchego e carinho. Essa energia e essa abertura transbordava para o grupo, que acabava sendo privilegiado com situações inusitadas, não programadas, mas inesquecíveis.

       Foi o caso, quando visitamos a Universal Studios. A atração era uma encenação de Indiana Jones. Nela, o protagonista lutava contra bandidos numa paisagem árabe africana, que, armados com sabres corriam atrás do herói, por sobre telhados, paredes de pedra de antigos monumentos e escadas, e finalmente se enfrentavam, o herói e o chefe do bando, num combate corpo a corpo cinematográfico, como não poderia deixar de ser.

       O grupo ocupava uma plateia enorme, em meio a centenas de outros turistas que vibravam com a apresentação. O vilão principal era moreno, alto e forte, metido numa roupa branca, a cabeça envolvida por um turbante. Brandia a espada, subia e descia escadas, pulava de telhados, dava e tomava socos.

       Por fim, vilão que era, foi eliminado pelo herói. Sua aparência moura, e seu porte vigoroso me lembrou Brandão. Virei-me para o lado, onde estava sentado, há umas duas cadeiras da minha, para comentar a coincidência. Cadê Brandão? Olhei novamente para o palco onde a cena se desenrolava. Agora eu não tinha mais dúvidas: o cabeça da bandidagem, estendido morto no chão, era mesmo Brandão. Esgueirando-se pelas sombras da plateia, tinha alcançado os bastidores onde vestiu o traje das arábias e partiu imediatamente para a ação, antes que qualquer um do grupo pudesse perceber.

       Era o presente-surpresa que tinha preparado, com a cooperação de diretores e atores do esquete, para vibração e encanto dos membros de seu grupo. Havia anos treinava, sempre que fazia as visitas prévias, galgando papéis cada vez mais complexos no esquete.

      Um segredo profissional que só compartilhou com seu melhor amigo quando o pode finalmente exibir.