POR TERRAS AMAZÓNICAS II

II

Para que os maus pensamentos não se apoderassem de mim, até porque a mochila também já começava a pesar, repito, uma vez mais, para a pessoa com quem mais dialoguei até hoje, Poly, tranquilo, está tudo bem, já estás quase a chegar, e nisto, ouço uma mota ao longe. Quando se aproxima, faço sinal para parar, pergunto-lhe onde ficava o Ambulatório da D. Mariquinha ao que ele me respondeu que a clínica era da sua mãe e ficava mesmo ali à frente. Felizmente era mesmo ali à frente, comparado com o que já tinha andado.

Uma hora depois, numa conversa já à luz de velas, apercebo-me que a luz eléctrica ainda não tinha chegado àquela região, qualquer televisão, rádio, computador e mesmo o meu telemóvel, eram objectos obsoletos. Um sapo enorme como nem imaginava que houvesse, quis também dar-me as boas vindas, não gostei muito da visita, mas cedo acostumei-me a conviver com semelhantes criaturas. Mas, quem mais se divertiu com a minha presença, foram os pernilongos ( melgas ) que tantas vezes me deixaram crivado de picadas.

Dona Mariquinha, já na casa dos sessenta, havia sido professora até que um cancro na garganta a deixou quase à beira da morte, ou pelo menos, já desenganada pelos médicos que nem cirurgia aconselhavam, pois o risco era muito elevado e as probabilidades de sobreviver eram diminutas.

Vi uma mulher perfeitamente normal, sorridente e dócil, que depois de curar-se, (basicamente com aplicações de barro, banhos com plantas, chás, alimentação vegetariana, remédios caseiros e uma fé inabalável, no poder curativo da natureza e de Deus) se pôs a estudar Medicina Natural. Construiu esse Ambulatório e “deu vida” (como lhe haviam dado) a milhares de pessoas que maioritariamente desenganadas também pelos médicos, vinham de todo o Brasil para ali se curarem.

A fé em se curarem era tanta, que por si só, já constituía um importante factor de cura, sendo indiferente, o facto do Ambulatório, como toda a região envolvente, não ter ainda acesso a luz, água potável, saneamento básico, entre muitos outros indícios ou traços que caracterizam os aglomerados civilizacionais.

Apesar das condições precárias, tinha o calor e o contacto humano, que a maioria dos hospitais e clínicas do mundo não têm, como se fosse a família mais amiga, como se as pessoas estivessem a chegar à sua casa de campo, e ali estivesse o seu amor à espera, com um sorriso de orelha a orelha, onde o conforto do trato era mais importante que a ausência de todo o desenvolvimento tecnológico.

Tudo o que cura realmente estava ali, e era aquele carinho, aquela ternura, aquele tratar pelo nome e não pelo número ou doença, aquela palavra amiga que deixava a pessoa tranquila, descansada, crente que em breve estaria curada.

E era a terra, aquela terra vermelha, que pouco tinha de argilosa e muito de barrenta, uma terra viscosa, avermelhada, com um cheiro tão activo, tão agradável, tão brilhante, que por si só parecia curar, tal como já há dois mil anos ensinou o Mestre Jesus Cristo, pois toda a terra é curativa como Hipócrates também dizia.

Policarpo Nóbrega
Enviado por Policarpo Nóbrega em 13/01/2020
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