Seu nome na Bíblia

     1. Às vezes, discutindo assuntos religiosos, pago um alto preço só por ter sido seminarista. Acham que devo estar preparado para esclarecer, com o máximo de precisão,  qualquer questionamento referente a temas ligados à Igreja.  Estudei seis anos nos seminários franciscanos, no Ceará e na Paraíba, no século passado; para ser mais preciso, de 1947a 1952. Tempos ótimos, por sinal.
     2.  Querem ver? Meus velhos e novos amigos e minhas venustas e queridas amigas juram que deixei o seminário conhecendo profundamente a Bíblia Sagrada, no seu todo: o Antigo e o Novo Testamento. Ora, parceiros, o Antigo Testamento tem 39 livros e o Novo 27, fora as Cartas paulinas, et cetera, et cetera.
     3. Conheço pouco o Antigo Testamento. Ele é difícil de ser lido e interpretado. Para dizer a verdade, retorno, esporadicamente, ao "Eclesiastes" e ao livro dos "Provérbios". Com mais frequência, entretanto, volto ao "Cântico dos Cânticos", confirmando ser ele o livro que mais gosto. Salomão foi feliz ao escrevê-lo. 
     4. Há os que me têm, eu, um ex-seminarista, como conhecedor dos capítulos e versículos bíblicos e como intérprete dos textos sagrados. Querem-me, pois, como Teólogo e exímio exegeta. Pode acontecer que um ou outro ex-seminarista tenha chegado a esses elevados patamares. Eu continuo na planície.
     5. Sempre que sou instado a tecer comentários sobre os textos bíblicos faço-o com o cuidado de não engrossar a fileira dos que abrem a Bíblia e tocam a interpretá-la, vomitando heresias inomináveis. Põem na caneta dos nossos Evangelistas coisas que eles nunca escreveram. E até na boca de Jesus o que o Messias nunca disse, 
     6. De repente uma querida amiga, a Dalila, me fez esta pergunta: "Você, por acaso, sabe me dizer onde está meu nome na Bíblia?" E completou: "Estou sabendo que Dalila foi uma mulher forte e corajosa. E que alimentou um romance com um tal de  Sansão, um cara de uma insuperável força física. 
     7. Satisfazê-la na sua justa curiosidade, era o que eu mais queria. E corri atrás. Lembrei-me que, na minha estante de livros sacros, estava "Mulheres na Bíblia", do escritor inglês John Baldock. Muito interessante esse livro.
     Traz, por exemplo, a história da "rainha de Sabá", a história das "mulheres estrangeiras de Salomão" e a história da nossa Sulamita, aquela do "Cântico dos Cânticos", livro visto por muitos como "um cântico de amor".
     8.  Consultado o livro e depois de dar uma espiada na Bíblia, eis o que disse à minha amiga. Que Dalila aparece no Velho Testamento, in Juízes 16:4-21. Que fora uma mulher muito bonita, destacando-se ao fazer Sansão o seu amante. Cabendo-lhe, entretanto, a missão, que lhe fora dada pelos filisteus, de descobrir de onde Sansão tirava aquela indomesticável força física.
     9. Sanção, que mantinha, em irremovível segredo, de onde vinha essa sua força, encantado com Dalila, terminou, traído por ela, confessando à amante que estava na sua longa cabeleira o vigor que o fazia o homem mais forte do seu tempo. E Dalila não hesitou em raspar-lhe a cabeça, enfraquecendo seu rendido amante, e, ao mesmo tempo, agradando aos filisteus.
     Constatei que Dalila desaparece no final da vida de Sansão; este morreu cego e esmagado pelas paredes de um templo que fez cair sobre ele e sobre os filisteus que o acompanhavam. 
     10. Minha amiga mostrou-se horrorisada com a história de sua xará. Confessei-lhe que, particularmente, não aceitava como verídica a história envolvendo Sansão e Dalila, tal como contada pelos escribas do livro Juízes. 
     11. Mas só consegui reanimá-la quando lhe falei sobre o significado do seu nome. À amiga Dalila Ferreira, uma coroa de apreciável porte e "olhos doces e oferecidos" (Josué Montello) eu disse: veja, o significado do seu nome é "desejada", "delicada".      Dias depois, confessou-me, pelo celular, que estava orgulhosa com o nome que recebera na pia batismal.          

 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 15/08/2020
Reeditado em 15/08/2020
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