A vez dos suínos

 

 

          1. Um amigo meu, todas as vezes que peço uma salva de palmas para as serpentes, ele esbraveja e me repreende. Não admite que se aplauda "bicho tão perigoso e nojento". 

          Simpático ao Hedonismo, não perdoa as serpentes, culpando-as pelo fracasso do Paraíso. Garante que se não fosse a cobra estariamos todos, filhos de Adão e Eva, numa boa, até hoje.

          Difícil é querer convencê-lo de que é duvidosa a existência do jardim do Édem, criação perfeita do profeta Ezequiel (31), no Gênesis 13:10; além do estranho fechamento de suas portas. Segundo a  Bíblia, teria sido a cobra a responsável pelo desmoronamento do projeto Paraíso.

          2. Certa ocasião, mostrei-lhe a crônica que eu havia escrito em 15 de outubro de 2006, aqui nesse espaço, intitulada "A vingança das serpentes". Nela mostro, ou reavivo na memória do povo, quantos benefícios trouxe para a humanidade o veneno da cobra, apesar de amaldiçoada por Jeová.

          Mas o Joaquim, não aceitando meu canto de elogios às serpentes, chamou-me, entre outras coisas, de blasfemo; e continua condenando, de forma intolerante, as cobras. Para não pairar dúvidas, confessei ao amigo ter, das cobras, o mais escandaloso pavor. Mas, sempre ao lado da ciência, reconheço e proclamo, sem nenhum preconceito, o que de bom seu veneno tem proporcionado à humanidade.

          Na minha crônica de 2006, cheguei a admitir que as serpentes estavam se vingando ao doarem o seu veneno para servirem como remédios. E lembrei, para efeito de ilustração, que o pessoal da saúde - médicos, enfermeiros, farmacêuticos, dentistas - traz, no seu diploma e no seu anel, uma cobra a identificá-los.

          3. O mesmo diria eu dos ratinhos. Eles povoam nossos laboratórios, como cobaias, dando ao estudioso o material que será usado em benefício da humanidade. Falarei sempre bem deles porque, apesar de sua imensa periculosidade, ajudam os cientistas a curar doenças graves. 

          4. Agora é a vez dos nossos gorduchos porquinhos. Ao contrário dos homens, cuja obesidade põe em risco permanente sua vida, o suíno quanto mais gordo melhor. Se não bastasse ser o dono da melhor carne, a mais saborosa, os cientistas acabam de descobrir que o coração do porco pode ser implantado no ser humano. Esse assunto vem movimentando a imprensa internacional. E o cronista não podia passar ao largo. É seu dever registrar o fato. 

          5. Estampa um jornal de alta credibilidade o seguinte: "Paciente recebe coração de porco com genes modificados". E prossegue o jornal: "Homem de 57 anos tinha doença cardíaca terminal e passa bem depois de cirurgia de oito horas em Baltimore (EUA)". Esse estranho implante, segundo os médicos, traz para os cardíacos desenganados uma alentadora esperança. 

          6. Detalhes sobre essa estranha cirurgia coronáriana, pela sua complexidade e surpresa, no momento pode até não interessar ao povão. Mas interessa-lhe a notícia de que o homem já pode sobreviver com o coração de um suíno, inimaginável até bem pouco tempo. 

          7. Divulgando a auspiciosa notícia, dando-lhe o necessário destaque, o cronista procurou registrar o fato do agora; alegrando o coração dos cardíacos. Foi, pois, o seu objetivo maior. Um fato acontecido tão longe dos nosso Centros Cirúrgicos. Mas logo chegará por aqui.

          Antes do ponto final, dou uma sugestão, embora reconhecendo ser impraticável: tentem transplantar para o homem o coração de um passarinho... ele, com certeza, será mais feliz... 

            

 

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 25/01/2022
Reeditado em 29/03/2022
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