Um pulo na O.N.U

Encontrei no supermercado um amigo de bar que não via há uns bons dez anos. Conversa vai me perguntou se conhecia a senhora Augusta, idosa, rica que havia falecido. Neguei claramente e de fato nunca havia ouvido falar nela. Mas como! Exclamou. Todos a conheciam. Era rica. Rica não, riquíssima! Empenhado que sou em amar a simplicidade, nunca tive oportunidade de conhecer pessoas opulentas.

Digo amigo, porque sequer lembrei seu nome. Procurava mentalmente, diante dele, mas estaquei confuso entre Aderbal, Juvenal ou Valdemar. O pobre estava abalado pelo efeito desse passamento de senhora da alta classe. O Aderbal costumava cortar a grama do jardim da senhora Augusta, e até fazer serviços caseiros, por alguns vinténs. Depois se saiu com essa: quando morre um rico, choro, porém quando morre um pobre, eu comemoro e festejo! Dedico uma fanfarronada a quem estica as canelas na pobreza. Fiquei impressionado. Antes de me pedir uma moeda, logo percebi que a sua condição de adeus seria bastante festejada.

Gosto do silêncio e da quietude. Sempre gostei. Fui menino tímido e calado. Vejo com tristeza a incompreensão do silêncio no comportamento coletivo. Por que será que a alegria deve ser ruidosa? Os mortos caem no silêncio, deve ser por isso. A morte é antagonista da alegria. Como existe pobre e excesso de Aderbal sobre o manto da terra a vida gira numa barulheira confusa e intrigante.

Somos seres vivos da superfície e fizemos muita barafunda, algazarra, tumultos, bombardeios, pandemônio. Nesta hora incontáveis carros, caminhões, motos, foguetes, aviões trepidam o solo. As escolas estão repletas de crianças num vozerio perturbador, aos gritos, bradando o direito exclusivo da atenção; impossível para todos ao mesmo tempo.

Há muito barulho no mundo.

Moro na frente de uma grande escola e não consigo paz para ler e nem eles desejam a leitura. Escuto todos os gritos, estridentes, horripilantes, sinfônicos, meramente praticados para exercitar a vaidade. Grito sem dor sublimando o medo do futuro.

Darei um pulo na O.N.U para solicitar alguma resolução ao problema da barulheira humana: A criação do Dia Mundial da Meditação. O 7 de maio, dedicado ao Dia do Silêncio, está fracassando quanto aos resultados. Assim, quem sabe, possamos ouvir a subjetividade do mundo em paz, além do canto mais lindo dos pássaros, desesperados, graças ao excessivo barulho dos homens sobre a terra.

Talvez meu amigo Aderbal escute o choro real da pobreza sem festejar a miséria social.

10/02/2024