Eu sem jardim, elas sem elogios!

Amanheci alegre para uma caminhada, sem pressa pela cidade, pois havia dez dias que estava em viagem sem apreciar o que ainda resta de belo por meus caminhos de rotina. Minutos depois retorno da caminhada entristecido. Aquele muro era mais um que surgia e me deixou sem vontade de caminhar, estava no meu caminho visual atrapalhando minha visão. Era como se a Rosa, a Margarida e a Violeta tivessem fechado a janela para que eu e meu olhar não as despíssemos das pétalas; em um imaginário bem me quer mal me quer! Por que seu Urbano encomendara aos rápidos pedreiros e cercavam o jardim e acima do muro colocavam um cerca elétrica?

A senhora Luzia e sua irmã Luíza cuidavam tão carinhosamente do jardim, pelas manhãs que eu por ali caminhava como cuidavam do esposo e filhos, e notava-se a felicidade ao termos a sensibilidade de elogiar aquele recanto tão belo. Mesmo que através das fortes grades que até então era a proteção que tinham. No início do século passado meus avós ainda contemplavam as casas além dos jardins, apenas protegidas pela portas, como em filmes de Hollywood... Meus pais cresceram vendo crescer cercas e muros de baixa altura... Eu e meus contemporâneos estamos vendo os muros que nada nos deixam ver... E meus filhos e sobrinhos? E os netos se adaptarão a esse modernismo enclausurado? Talvez tenhamos que morar em casas como fortes rochas, similares a cavernas. Será pós ou pré-história?

Em casa, ainda pensativo sobre o porquê deste urbanismo frio e metálico, com o belo oculto atrás de muros altos e chapados portões, vigiado por câmeras e barulhentos alarmes, fui aos meus arquivos de fotos procurando alguma daquele jardim. Não tenho fotos, pois nunca esperava tal “evolução”, fica a imagem apenas na lembrança! E os bonitos jardins públicos onde passeio, será que em um dia futuro os teremos? Apresso-me em fotografar todos os jardins antes que eu tenha de estar no céu para que os veja, e deixarei aos meus netos para que vejam como é lindo poder ver um jardim urbano!

Agora fico a pensar nas senhoras jardineiras. Do que será da vaidade e alegria dessas irmãs ao serem elogiadas pelo bonito jardim? O jardim que eu perdi a rua que já não me interessa passar. As rosas, as violetas e as margaridas podem ficar despetaladas, não as verei, não mais imaginarei quem bem me queira ou quem de mal me queira, tijolos não são pétalas, são frios e cheiram a cimento, não têm vida, antes caiados nos sepultam vivos! Um dia não havendo jardim, não haverá praça. Por onde a bandas vão passar tocando coisas de amor?