SEIS POR MEIA

Pela convenção oficiosa de uns anos para cá, não existe mais o seis. Nem o vinte e seis. Muito menos o seiscentos e trinta ou qualquer outra composição numérica na qual o antigo seis esteja enfiado, seja em que posição for. Quem antes morava na Rua dos Romeiros, número trinta e seis, mesmo não tendo se mudado nem tendo havido alterações de números em sua rua, hoje mora no “três meia”. Ainda se escreve 36, mas não é trinta e seis. É “três meia”. E tenho certeza de que você leu assim, mesmo diante dos algarismos.

Pois é; o diabo do meia invadiu as nossas vidas e não aceita concorrência. Quando alguém o pronuncia, temos que adivinhar que se trata de meia dúzia; não de meia dezena, meia centena, meia milha, meia lua ou meia fedorenta. Ele desmantela e distoa, e mesmo assim é soberano. Quem quiser que especifique e dê sobrenomes aos outros meias, pois o meia reinante é ele, o meia dúzia, que não aceita mais que o xinguem de seis. Quem o faz pode ser prontamente rechaçado, ainda que delicadamente, pelos meeiros de plantão, que na verdade são quase todos.

Se lhe pedem o número de seu telefone e você começa: “Dois oito seis...”, logo é interrompido: “Dois oito meia; né?”. Até o famoso número da besta está mais besta do que nunca; ou seja: Mais “meia meia meia” do que já andava. Nada de “seis seis seis” nem de seiscentos e sessenta e seis, e ninguém é besta de protestar. O mundo está cheio de crianças com meia anos de idade; idosos com meia cinco anos; pessoas de um metro meia cinco de altura, e calcule comigo: Seis dúzias de ovos, agora, são meias dúzias de ovos. A velocidade ideal para carros é de meia zero quilômetros por hora.

Ficou mesmo engraçado contar, depois da onda do meia: “Um, dois, três, quatro, cinco, meia...”; “trinta e quatro, trinta e cinco, três meia...”; “cinco mil, novecentos e noventa e oito; cinco mil, novecentos e noventa e nove; meia zero zero zero...”. Para ser sensato, é melhor ficar por aqui, pois se a mania tomar o mundo inteiro, não poderei debater contra os mais ou menos meia meia meia meia meia meia meia meia meia meia habitantes do nosso planeta.

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 03/05/2010
Reeditado em 03/05/2010
Código do texto: T2234220
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