Lógica e Psicologia

    Nós vamos fazer aqui, apenas uma distinção entre estas duas ciências. Para isto, torna-se necessário defini-las, e por isso mesmo limitá-las. As ciências diferem entre si, quanto ao objeto material ou objeto formal. Há ciências que têm o mesmo objeto material, mas difere quanto ao objeto formal. A Lógica e a Psicologia diferem tanto quanto ao primeiro como quanto ao segundo. Isto não quer dizer que a Psicologia não tenha necessidade da Lógica, pois, como veremos adiante, a Lógica é de grande importância para todas as ciências.
    Port Royal definia Lógica como sendo "A arte de pensar"; mas pode-se notar aí algum exagero. A Lógica estuda o raciocínio que existe no espírito humano - não o cria, da mesma forma que a fisiologia estuda a digestão, sem que isto a facilite. A Lógica não pode dar correção de raciocínio a quem não a possua. Mas introduz em nosso pensamento, a clareza, a ordem, e a precisão.
   Embora sendo uma ciência que estuda o espírito humano de umponto de vista particular, é indispensável às outras ciências, é portantoum instrumento de pesquisa e formulação valiosíssimo, pois estuda os processos que as outras ciências empregam para atingir a verdade - é o método que determina os métodos a serem utilizados.
   A Lógica estabelece condições de legitimidade, de coerência interna de um pensamento, e não de existência, podemos portanto definí-las como: “a ciência das leis ideais do pensamento, e a arte de aplicá-las corretamente à procura e a demonstração da verdade".(1)
  Isto não impede a existência de uma "lógica espontânea ou empírica", que é apenas uma condição inata do espírito para usar coerentemente as funções intelectuais. Não tem, contudo, os elementos indispensáveis para as justificações racionais. Porém, em operações intelectuais menos complexa, podemos nos bastar com esta lógica, que Leibnitz chama de bom senso.
 A Lógica cientifica, usa naturalmente os elementos escolhidos pelaLógica empírica, e auxilia o espírito na tarefa de fazer uma análise maisprofunda e justificar os princípios que baseiam sua legitimidade.
  Como a Lógica é a ciência que nos auxilia a proceder facilmente e sem erro no ato da razão, ocupa-se da forma e da matéria de nosso raciocínio.
    Temos então a Lógica Menor ou Formal - que estuda as condições formais das ciências, analisa o raciocínio nas leis de que ele depende, doponto de vista de sua formação e de sua disposição, conforme constitui o objeto dos Primeiros Analíticos de Aristóteles.(2) Ensina as regras para seguir o raciocíneo correto.
  A Lógica Maior ou Material estuda as condições materiais da ciência;mostra a que condições devem corresponder os materiais do raciocíniopara se conseguir uma conclusão firme sob todos os aspectos não somente quanto à forma, mas quanto à matéria, uma conclusão verdadeira e certa.(3)
     Isto é, nos raciocínios científicos, cumpre distinguir:
–   A materia – ou seja, os fatos dos quais uma ciência se ocupa.
– A forma do raciocínio – ou seja, as relações que o espírito humanoestabelece entre estes fatos.
   Uma parte da Lógica não se preocupa com a natureza dos fenômenos estudados pelas ciências, mas apenas com a disposição dos raciocínios, com a forma na qual se harmonizam os fatos.
  A segunda parte da Lógica preocupa-se com os fatos particulares e com as modificações; as quais nosso raciocínio se submete enquanto há aplicaçao a esta ou àquela categoria de fenômenos - esta lógica pode ainda ser chamada de metodologia.
   A Lógica, porque estuda a validade intrínseca do raciocínio, distingue as seguintes fases: aprender (concepção da idéia); julgar (afirmação ou negação de uma relação entre idéias); raciocinar (partindo-se de dois dados - juizo – concluir um terceiro, necessário).
   O raciocínio coerente, não é, necessariamente intuitivo - ele exige uma explicação, um começo, um princípio, ou seja: uma causa. Em Lógica, considera-se princípio aquilo de que uma coisa procede. Toda causa é ao mesmo tempo princípio (embora a recíproca não seja verdadeira). A causa está implicada na própria existência da coisa.
 Há quatro tipos de causas: material, formal, eficiente, final. A diferenciação destas causas determinam e limitam as ciências.
  Quanto a Lógica, que é um dos objetos do presente trabalho, podemos distinguir:
a) Causa Material – atos da razão;
b) Causa Formal – retidão, correção formal;
c) Causa Final – verdade.
  E a Psicologia, usando desde já o auxílio da Lógica distingue igualmente:
a) Causa Material – atos da razão e fenômenos do comportamento ou vivos;
 b) Causa Formal – a manifestação de um ser vivo, de um sujeito em sua origem e desenvolvimento;
 c) Causa Eficiente – todo o homem;
 d) Causa Final – verdade.
   Aí temos, portanto, a finalidade comum a todas as ciências, incluindo naturalmente a Lógica e a Psicologia: a conquista ou descoberta da verdade.
  O têrmo psicologia (do grego psyké-alma e logos-ciência) é relativamente recente; o que se considera hoje em dia como sendo psicologia, outrora, era englobado no conceito de Filosofia. Os estudos concernentes à Psicologia eram confundidos tanto com os dos métodos lógicos que levavam à conquista da verdade, como com a pesquisa das verdades morais que devem dirigirir a conduta.
  Aristóteles a considerava como um dos ramos da Filosofia da Natureza. Contudo, tanto Aristóteles como Santo Tomás de Aquinotinham determinado “os princípios que justificam a divisão da Psicologia experimental e filosófica”, notando que para chegar a definir a natureza da alma, “é mister começar pelo estudo dos fenômenos psicológicos, considerados em si mesmos e em seus objetos, segundo o método das ciências especulativas”.
     Na Idade Média foi confundida com Pneumatologia (grego pneima-alma e logos-tratado), o estudo de seres intermediários entre Deus e ohomem. No século XVI encontra-se este termo num livro de Gloeckel, mas outros afirmam que o teólogo alemão Melanchthon o usava frequentemente anos antes. Apenas no século XVII, Wolff emprega o termo psicologia com as implicações que compreendemos atualmente, em seu "Psychologia Rationalis”.
     Foi, por muito tempo considerado como "a ciência da vida mental, de seus fenômenos e de suas condições" - conforme William James.
Atualmente há uma definição mais geral, quando ela é considerada comoa "ciência que estuda o comportamento". É preciso que se compreenda, que não se trata unicamente do comportamento objetivamente observável, mas também da ação que o envolve, a interação do organismo e de seu meio, o processo psicológico consciente e o inconsciente.
  A Psicologia é uma ciência por si só suficientemente ampla eespecífica, embora naturalmente, precise de outras ciências como fonte de informação.
  As ciências, gradativamente, à medida em que se expandem podemdividir-se em partes ou especializações que facilitem seu aprimoramento.Podemos citar uma breve divisão da Psicologia, tendo-se em conta a localização histórica e o conteúdo.
 
a) A Psicologia racional
– essência da alma racional (Platão, Aristóteles, Santo Tomás de Aquino etc.);
b) Psicologia empírica – sensação, faculdades mentais (Loocke, Hume, etc.);
c) Objetiva – fenômenos psíquicos (Weber, Wundi, James).
 II –
 a) Psicologia geral – estuda o objeto e métodos da Psicologia, as leis gerais dos fenômenos psíquicos;
b) Psicologia especial - que se subdivide em: evolutiva animal, evolutiva ontogenética, evolutiva sociogenética (infantil e do adolescente).
  III –
 a) Psicologia aplicada que se subdivide em: educacional, psicotécnica etc.(5)
   Observemos, entretanto, que apesar da diferença de objeto a Lógica dá a mão a Psicologia.
 O raciocínio (objeto fundamentalmente lógico) tem, enquanto intelectual, uma só finalidade - conhecer a verdade objetiva. É uma adaptação aos fatos (qualidade, relações). Obviamente que em nenhumraciocínio o elemento subjetivo pode ser inteiramente eliminado (alguémpensa), é tão frágil nas relações corretas que pode ser posto de lado.
    “A função da razão é unificar, ou ao menos sistematizar”. (Ribot).
     O raciocínio emocional é uma adaptação às crenças, aos desejos
e às afirmações. Sua posição é subjetiva. Sabe-se que a vida afetiva,
independente, presta-se a pluralidade das tendências e até a sua desordem. A unidade não é ponto essencial de sua natureza e só é aplicada quando há a primazia de uma paixão: o amor, a ambição, etc. ou uma tomada intelectual que impunha ordem. O instinto belicoso que se demonstra pela ira, os atos violentos têm sempre uma finalidade própria.
    A lógica da razão é determinada pela natureza e a ordem objetiva dos fenômenos, enquanto constata ou conjectura ou mesmo na descoberta, é formada de estados intelectuais (percepções, conceitos) o mais depurado que for possível de seu contexto emocional.
   A lógica dos sentimentos é determinada pela natureza subjetiva de quem raciocina, a qual decide formar uma opinião ou uma crença. Origina-se no desejo positivo ou negativo que procura uma imagem como comprovação. É constituída de valores, ou seja conceitos ou julgamentos variáveis a partir das disposições do sentimento e da vontade..
CONCLUSÃO: Vejamos agora uma rápida e objetiva comparação entre Lógica e Psicologia:
  A Lógica estuda as condições da conformidade do pensamento consigo mesmo.
    A Psicologia visa às operações intelectuais do ponto de vista de sua natureza.(6)
   A Lógica tem por objeto o ser de razão - aquele que só tem existência em nossa inteligência.
     A Psicologia tem por objeto o ser real - vivências.
A Psicologia estuda:
– os atos da razão (é portanto mais ampla que a Lógica);
– o conhecimento como um ato vital, como fenômeno que provém de um ser vivo, vinculado a um sujeito, uma pessoa;
 – o conhecimento como uma atividade, um processo;
 – o pensamento como ele é: falso, correto, real etc.
 A Lógica estuda:
 – o raciocínio ideal (o que deve ser e não o que é);
 – o conhecimento como um resultado.

                                     
  Roberto Gonçalves
Escritor
                                              
 

Referências Bibliográficas:
1) JOLIVET, Regis - "Curso de Filosofia", ed. Agir - 5a. edição, RJ. - p. 25
2) MARITAIN, Jacques - "Elementos de Filosofia - Lógica Menor" - ed. Agir, RJ, 1962 p.23
3) Id. Ibid. - p.27
4)
JOLIVET, Regis - "Tratado de Filosofia" - vol. II Psicologia" , ed. Agir, RJ, 1963 - p.22
5) MUELLER, F. L. - "História da Psicologia" - p,35
6) JOLIVET, Regis. -
"Curso de Filosofia", ed. Agir, 5a. edição, RJ, 1961 - p. 30
RG
Enviado por RG em 13/08/2012
Reeditado em 28/07/2016
Código do texto: T3828108
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