CIÊNCIA E RELIGIÃO, PSICOLOGIA E ESPIRITUALIDADE

Uma das coisas mais complexas em nossa época é estabelecer os limites de uma determinada ciência e fundamentar critérios de sua atuação, sem deixar de se atentar para aspectos profundos do ser humano, como por exemplo, a sua expressão religiosa, a força mística que envolve as suas crenças e o seu pendor para a vida espiritual, a sua espiritualidade.

De fato, é correto dizer que não existe uma abordagem na história da psicologia, tal como a conhecemos, que pode ser designada de "Psicologia cristã" ou "Psicologia budista", embora existam influências de filósofos cristãos e demais pensadores religiosos no campo da psicologia, como Soren Kierkegaard, Santo Agostinho, Martin Buber, Paul Tilich e Karl Jaspers, especialmente nas psicologias profundas de inspiração junguiana, nas psicologias humanistas e existenciais, e na logoterapia de Viktor Frankl.

E diante do que foi explicado, não significa que pelo fato de não existir uma psicologia ou ciência que professa uma determinada religião, há uma negação explícita da religião, do dogma e da experiência numinosa da fé. Na verdade, sempre houveram homens da ciência que não só valorizaram tais vivências e certas doutrinas, mas também estabeleceram um diálogo fecundo recorrendo muitas vezes ao estudo da antropologia, da mitologia, da biografia do analisando/paciente e da filosofia a fim de dar uma luz para os dilemas mais profundos da alma dos seres humanos.

É Interessante, por exemplo, afirmar que existe toda uma psicologia peculiar sobre a alma cristã, na qual podemos desenvolver com base no estudos dos evangelhos e da mitologia do pecado original; e, outrossim, uma psicologia toda própria da alma budista e que professa uma determinada filosofia ou religião oriental com base nos ensinamentos de Buda.

Há certamente diferenças nas psicologias de determinados grupos religiosos e espirituais; distinções marcantes até mesmo entre grupos religiosos cristãos, ou seja, que vão refletir na sua maneira de se vestir, de se alimentar e de se comportar. Como também, há muitas variações de indivíduo para indivíduo na sua maneira de compreender o mundo e a vida. Pois em cada ser humano há uma cor particular sobre a relação da sua experiência com determinado dogma e de sua vivência com o aspecto mais luminoso e transcendente na existência humana.

Uns mais devotados a força do grupo, desenvolvem uma consciência que mais se aproxima das aspirações e filosofias provenientes do seu grupo do qual fazem parte. Já outros, embora pertençam a algum grupo, desenvolvem uma individualidade mais independente da cultura da qual fazem parte. É nessas pessoas que existe uma propensão ao espírito filosófico e científico, ou então a uma espiritualidade permeada de espírito crítico e de uma profundidade ímpar.

Qualquer ciência que queira, então, estudar uma religião precisa estabelecer um diálogo profundo entre as várias áreas do saber, como a antropologia, a religião, a psicologia, a sociologia, a psicologia da história do indivíduo e também a filosofia. Com tal consciência da complexidade de um assunto de vital importância como a religião, é possível aplainar as diversas dificuldades e, ainda mais, dar uma luz de saber sobre as possíveis vivências no caminho do numinoso e do desconhecido.

Na verdade, é importante ressaltar que a espiritualidade, a religião e a, mormente, a experiência espiritual, sempre serão assuntos imprescindíveis para a psicologia do indivíduo e de grupos que professam una determinada confissão ou credo.

Existem, de fato, psicólogos que se interessaram profundamente em estudar as várias religiões, as experiências místicas e as vivências oriundas da fé. Podemos mais uma vez citar entre esses pensadores e psicólogos os de grande renome, como o proprio Vitor Frankl, além de Carl G. Jung, Rollo May, Otto Rank, Lévy-Bruhl, entre outros. Este último, por exemplo, cunhou o termo expressão participação mística para designar um fenômeno de forte carga religiosa, que é, portanto, capaz de envolver as pessoas numa determinada força coletiva. Tal força coletiva pode propiciar no ser de um certo indivíduo uma profunda sensação de pertencimento a um grupo, cujo magnetismo pode ser inspirado por uma concepção de ordem religiosa e mística.

Baseado nessa perspectiva trazida pelo antropólogo Lévy-Bruhl, podemos compreender muito bem a necessidade humana por explicações de ordem transcendente e mística como forma de dar um sentido mais elevado para a existência e como forma responder aquelas questões mais urgentes do ser humano. Por essa razão, a psicologia não só pode dialogar com as diversas expressões religiosas, mas também pode iluminar as nossas consciências a respeito do fenômeno sublime da fé, do amor no sentido de ágape e da espiritualidade que move os homens para a conquista de uma vida renovada e de intensa transformação.

Alessandro Nogueira
Enviado por Alessandro Nogueira em 05/04/2022
Reeditado em 07/04/2022
Código do texto: T7488460
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