Era uma vez um Cágado. 
Por Carlos Sena 


Era uma vez um cágado. Ele vivia triste porque as crianças nunca queriam saber dele. Na casa onde morava havia duas crianças e o coitado do cágado ouviu, certa feita, quando uma das crianças pediu aos seus pais um gato de estimação. Em seguida o outro filho pediu um cachorro. Pronto, pensou o cágado. Agora vem um gato é um cachorro pra me aporrinhar a paciência. Tudo isso porque o sonho do cágado era que sua solidão fosse rompida com uma cágada. Mesmo um outro cágado, pois já estava cansado de viver sozinho naquela casa. Uma coisa encafifava o solitário cágado: "quando o cachorro vier será que vai me atacar"? Conformava-se a si mesmo por conta da sua proteção! "Qualquer ataque do cachorro eu me fecho em meu casco e pronto"! A menos que o cachorro desse um bote em sua cabeça o cágado foi aos poucos perdendo o medo do cão que estava por vir. Mas, por ironia, o gatinho veio primeiro. E foi um inferno na vida do coitado e solitário cágado. Mal o cágado espichava suas perninhas curtas para carregar aquele casco pesado em busca de uma comidinha, o gato avançava em sua cabeça e, por pouco não lhe mordia. Muitas vezes o cágado ia colocando sua cabeça pra fora bem devagarzinho - como quem não quer querendo, mas, o gato, escondido numa moita de capim avançava com gosto. O coitado do cágado, exaurido de fome, tinha que fazer alguma coisa mas não sabia o quê, pois poedeira ser surpreendido pelo esperto bichano. De repente, a menina dona do gatinho o pegou, colocou uma coleira e foi com ele ao veterinário. O cágado suou frio, mas foi aos poucos andando e conseguiu comer um caroços de cajá que estavam por perto. Depois alcançou umas folhas de couve e uns pedaços de gerimum e, aí sim, refastelou-se. Voltou pro seu cantinho com seus passos vagarosos, oh sofrido cágado! 
A noite veio e ele se acomodou em sua "casa". Relaxou bastante, mas foi acordado com sua "casa" sendo jogada com toda violência. Era o cachorro que acabava de chegar naquela casa! Pronto. As duas crianças agora tinham gato e cachorro e eu não sou nada mesmo, pensou o cágado. A sorte foi um buraco na cerca: o solitário cágado depois de vários safanões que o cachorro, com seu focinho, lhe dava adentrou a cerca e alcançou o outro lado da rua... O cachorro ficou tentando alcançá-lo com sua patas em vão. O cágado estava do outro lado da rua são e salvo, mas todo cagado. De repente, passa uma senhora que ia ao supermercado e, diante do abandonado cágado pensou: minha filha não gosta de gato nem de cachorro, mas adora cágado. Vou levar pra ela. E assim o pobre cágado teve seus dias de glória.
Carlos Sena (nunca escrevi um conto infantil)