48 - ESPECIALMENTE PARA VOCÊ...

Mãezinha


Falar que minha mãe era uma pessoa especial, é lugar comum na praça, na feira e no mercado. Não era de reclamar de nada na vida, mesmo nas crises fossem elas financeiras ou domésticas ou outras quaisquer e eram tantas as crises que segundo ela “das crises às soluções” só um passo. Se não tem remédio, remediado está, assim ela dizia. Portanto, o que restava era crescimento. Crianças nascendo e dificuldades aumentando. Isto era notório e, portanto visto.

Paciência ali não tinha limites e desta também era mãe. De tudo que podia fazer não vacilava: mãos na massa. Trabalhar noite e dia, creio até que demais, porém carinho ali não faltava. Talvez em um processo de transferência de relacionamento difícil, meu pai desde que me lembro e reconheço era só serviço, meses fora de casa, buscando ganhar o sustento. Toda carga de educar as crianças, 12 filhos, ficava por conta dela, era dos livros às panelas e mais ainda lavar, passar e ensinar a orar e orar. Eram muitos os momentos.

Se estivesse cansada, ainda assim não parava e nem perdia a bendita paciência. Com a colher de pau na mão a mexer o angu de todos os santos dias, levantando a colher dizia! – Menino pára de me atazanar a vida! Vá atentar o cão com reza!
Se houvesse o santo do dia, e havia, o angu no almoço e janta também teria...

Minha mãe, digo, nossa mãe tinha maneira peculiar de falar, assim, ditado por ditado fazia a nossa educação valer. Tinha sempre uma fala apaziguadora e muita meiguice no olhar, mas não se enganem: sexto sentido, premonições chamem do que quiser, até sentimento de coração de mãe, que percebe légua e meia de distância.

Quando a coisa não dava certo: ” -Não te falei?! Por falta de aviso não foi, levou as minhas palavras pelos caminhos do boi! Eu bem que recomendei não me ouviu por que não quis, agora que a vaca foi para o brejo, se vire! Não clame por céus e terra. Bem avisado que você Foi”. Tem um ensinamento preciso como navegar, ouça muito fale pouco pense antes de a boca abrir, não vá agravar os outros falando pelos cotovelos, considere, eu te peço três verdades inabaláveis: A primeira “Deus é maior”; a segunda em Salmos reforça a primeira. A terceira confirma todas as outras, portanto, a sua verdade vem sempre bem depois, mesmo aquela que as ciências há muito tempo prescreve, amanhã a própria a destrói e manda tudo para o ralo! Não vale falar mal do outros esquecendo o próprio rabo.

Fale mas, “pense bem”, desde já aconselho, depois de falar bobagens não adianta chorar. Pedir perdão! Às vezes você perdeu grande oportunidade de ficar calado!
Mamãezinha, como a chamavam as filhas e filhos dos seus, não a chamavam de Vó, só os meus! E ela dizia baixinho, como sua mãe, a Dindinha, elas até atendiam, mas, falavam Vó que eu conheço é cumbuca (cornija) de pó.

Na vida se alguém errasse o bote, se imaginando ou bancando o gato-mestre, o esperto, e não dando certo o trato. - Eu bem que lhe avisei, atrás de serra tem serra.

Assim levamos a vida inteira sob seus carinhos e afagos, cafuné, leite quentinho e boas recomendações que, assim como água benta, não fazem mal a ninguém. Ela não passou pela vida, foi presente o tempo inteiro. De Deus foi uma prenda!

Honrar pai e mãe ela ensinava. Bem mais que um preceito cristão é preciso e necessário o perdão. Até por quem foi mais atingida, não lhe negou o perdão. No caso dela mão pesada, no caso dos filhos ausência consentida e sentida. Nós, filhos e filhas, por laços de sangue ligados e não por qualquer circunstância, deveríamos perdoar bem mais cedo. O Pai me deu perdão, por tudo que faço, fiz e farei. Aliás, bem mais que isto, bem maior: Por meus pecados a SALVAÇÃO.

Foi uma lenta agonia, sofreu na vida e na sua hora, sem merecer eu garanto, se é que alguém merece. Mas nunca desesperou, viveu com alegria, mesmo nos momentos finais ela sabia o que viria: “Não quero ficar aqui no "MATER DEI", mesmo com todo esse conforto, carinho e atenção, se vou para o Pai, não me iludo, ir para casa é tudo que quero e preciso!” Bênçãos peço agora, por mais uma lição de vida. Assim, ela foi embora numa manhã de agosto, ficou pra nós tremenda saudade e a certeza um dia nos reencontraremos.
CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 27/06/2009
Reeditado em 10/02/2012
Código do texto: T1669966