Os verdadeiros líderes congregam multidões

Num passado não muito distante em que a ditadura era a pedra de toque do nosso país, predominava a figura do “chefe” sempre disposto ao mando, à imposição, à velha máxima “sabe com quem está falando”? No município de Alto Santo, muitos cidadãos foram testemunhas oculares dessa época sombria, entre eles: Lafaete Anselmo Pereira e Nodge Nogueira Diógenes. Se quisessem, poderiam “tirar o chapéu” para os poderosos, locupletar-se ou impor suas próprias vontades. Ao contrário, preferiram, ao longo da vida, seguir os caminhos da democracia, do diálogo franco, do respeito ao direito dos outros e exercer a Política em sua verdadeira acepção, sem seguir jamais os inescrupulosos caminhos por onde trafegam os temerários e os intolerantes.

Nos primórdios de Alto Santo, na condição de município emancipado, é até prescindível afirmar que as dificuldades eram palpáveis em todos os aspectos. Lafaete, como um trabalhador incansável, “cortava” as estradas empoeiradas em seu velho jeep, transportando amigos e deixando atrás de si os trilhos por onde passariam, posteriormente, outras gerações e que nem o tempo implacável seria capaz de apagar. Na sede ou em qualquer outra parte do município, onde houvesse um movimento popular, lá estava ele, com seu jeito simples, no meio do povo, como se fosse um ser onipresente. No esporte poderiam faltar: o roupeiro, o técnico, até a bola. Mas ele estava presente com o seu incentivo, seu linguajar característico, seu sorriso largo, manifestação inequívoca de uma amizade sincera acima de tudo, desde as pessoas mais humildes aos mais graduados da sociedade. Na Igreja era o primeiro a chegar, sem estardalhaços, com a simplicidade que foi o apanágio maior de sua vida e demonstrar que havia entre ele e a dimensão maior da espiritualidade, uma comunhão de amor universal, transcendente, superior, portanto, aos nossos mais grosseiros e bestiais instintos. Não obstante optar pelo sagrado e inalienável direito a uma religião, jamais deixou de respeitar os seus semelhantes que seguiam outros caminhos porque, no seu íntimo, tinha certeza de que a grande premissa é o Amor, de onde provêm a caridade, a solidariedade e o respeito, pilastras nas quais se constrói a vida solidamente.

Noutro recanto do município, nas proximidades do rio Jaguaribe, soergue-se soberanamente uma legendária fazenda, onde se apregoa a vida de forma exuberantemente bela. De um casarão cercado de verde, como um verdadeiro oásis, brotam a paz e a serenidade próprias das grandes almas. Em campanhas políticas ou em outros momentos, tivemos oportunidade de visitar esse castelo de sonhos. Ao meio dia quando o sol causticava impiedosamente, cristalinas águas amainavam o calor com as gotas que caíam artificialmente no telhado, e do alpendre sentíamos cheiro de chuva, ainda que o céu não esboçasse qualquer reação nesse sentido.

Nessa fortaleza inexpugnável de honradez, Dr. Nodge Nogueira Diógenes, ou simplesmente Dr. Nodge ou ainda “Seu Node” como o chamavam os mais simples, construiu uma vida pautada nos mais elevados princípios. Ali nunca faltou a mesa farta, o sorriso abundante, o abraço caloroso, o aconchego, a hospitalidade, o “rancho”, para uma verdadeira legião de amigos. Embora não tenha conseguido o objetivo de ser Prefeito de Alto Santo, foi um vencedor porque soube ser coerente com sua filosofia de vida e colocar os valores humanos acima de quaisquer outros, ainda que em detrimento de sua ascensão política e partidária e de ocupar funções que o engrandecessem. O cidadão, cônscio de seus deveres e responsabilidades, não precisa de cargos para promover o desenvolvimento de sua comunidade porque já o faz diuturnamente, no desenrolar de todos os seus atos.

Lafaete e Nodge fizeram de suas respectivas famílias um esteio de amor, de paz, serenidade, dignidade, nobreza e hombridade. Carregaram nos corações esses valores e os transmitiram aos seus descendentes. Esses esplendores da alma e reverberações do caráter eles construíram ao lado de duas grandes mulheres, sustentáculos de suas vidas carregadas de bênçãos e de frutos: Dona Odete e Dona Izaína.

Quis o destino que os dois partissem dia 27 de fevereiro e 1º de março de 2009, respectivamente. Foram chamados da mesma forma que conduziram suas trajetórias terrenas: serenamente. Sem sofrimento, angústia ou dor, sem enfrentar as agonias a que são submetidos os moribundos. Eram assim os seus desejos e tiveram a felicidade de ser atendidos pelo Pai.

Fica um legado cujo valor tangível, para a História de Alto Santo, não pode ser calculado. Permanecerá também a dor da saudade dos familiares e de um incontável número de amigos. A vida dos dois líderes foi o farol através do qual se guiaram os seus seguidores que estiveram nas últimas homenagens em Alto Santo e Fortaleza. Os verdadeiros líderes congregam multidões. Na vida e na morte.

Nicodemos Napoleão
Enviado por Nicodemos Napoleão em 07/07/2009
Reeditado em 07/07/2009
Código do texto: T1686485
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