UM DIA MAIS QUE COMUM...




Um dia para se ficar rolando na cama o dia inteiro.

Lá fora uma chuva fininha, copiosa e intermitente, caia fazendo um barulho gostoso ao rolar pela calha na beira do telhado e escorrer pelas correntes.

Pela vidraça da janela do interior do meu quarto, contrastando com o frio que fazia lá fora, o calor dos nossos corpos enrolados no grosso cobertor provocava uma tênue nuvem de gotículas d’água marcando uma trilha pela armação de alumínio das guarnições da janela.

Aquele friozinho em pleno mês de outubro parecia algo totalmente fora de propósito e inusitado, para o clima que estou acostumado aqui em nossa cidade, para as chuvas de primavera é tempo. Mas este frio de cortar até a alma da gente, nesta época do ano desde sempre que eu me lembre é mais que anormal. E o frio até parece que veio para suscitar na gente lembranças da nossa velha Itabira. Antigamente, nesta época de chuva a gente ficava olhando para o Pico do Cauê, quando ele ainda estava lá encoberto por densas nuvens. Hoje só resta o Cauê nas nossas lembranças ou nesta gravura que mantenho bem na parede atrás da tela do PC, ou nos postais antigos da cidade.

Fiquei ainda deitado muito tempo depois de acordado pensando, ou como diria minha amiga Graça Pena, “tempo bom para ficar bestando”, ou seja, sem fazer nada, pensando na vida.

Na cozinha barulho da minha filha dando tratos à bola para continuar fazendo uma, aliás, duas enormes panelas de tal de “fricassè” uma iguaria bem gostosa que ela gosta de preparar vez ou outra. Nesta data 23/10, aniversário da Alessandra e da minha neta Bruna, desde a tarde anterior já estavam iniciando a preparação dos ingredientes que iriam usar. Um forte cheiro de tempero invadia o ar, impregnando até a alma da gente e contrastando com o cheiro de terra molhada e o doce aroma de algumas espécies de orquídeas abertas colocadas lá na área da lavanderia, bem próximo do meu quarto que é no final da casa.

Onze horas da manhã, não dá mais para ficar na cama. As visitas começaram chegar para o almoço e, daqui para frente, será uma algazarra só: netas e sobrinhas correndo casa a fora e o pessoal adulto ferrado no jogo de cartas, entornando um bom vinho gelado e cerveja muito mais. Eu, que não gosto de cerveja nem vinho, vou aboletar-me no sofá da sala e ficar vendo todos os filmes que conseguir para programação de hoje, tomando suco de uva com gosto de saudade.

Ao meio dia meu irmão ligou dizendo de uma antiga vizinha nossa que falecera na noite anterior, aliás, a finada Dona Paulita, antiga enfermeira do Hospital Carlos Chagas, mãe,tia, avó e irmã de alguns colegas da nossa juventude no Bairro Campestre, uma pessoa por quem nutríamos um carinho especial. Assim é a vida, alegre comemoração de um lado, luto e tristeza noutro: mais que comum.

CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 25/10/2011
Reeditado em 23/01/2012
Código do texto: T3296427