Cronicas de almofadas

Ao Editor

Certa leitora dirigiu-se por carta a este humilde escriba tencionando ferir minhas intenções de despojado intelectual. Infelizmente o seu endereço é obscuro, hospedando-se dentro da Canoa Polinésia, 77. Sua tese contra minha criatividade coloca-me numa posição de grande constrangimento. Trata-me por um tipo frio como o período mais quente do Círculo Ártico. Sobre as imagens que utilizo trata-as por extravagantes, meramente rabiscadas, inúteis para o cultivo; tanto da razão, quanto da imaginação. Seus ataques belicosos continuam até entranhar pelo caminho dos costumes. “Decerto o senhor T. deve beber mais do que todos os escoceses da Escócia”. Certamente que sim, pois seria extravagante beber mais do que um escocês de Novgorod.

Todas as voltas que dá nas cinco páginas elaboradas à moda antiga, caligraficamente, alarga minha insignificância de vanidades, o que dou fé. E segue no fuzilamento em sua navegação costeira, sempre melhor e superior, sempre perfeita sobre mim como todos os computadores de agora. Eu apenas navego em aparas o oceano da razão embarcando em cada frase o meu transe medonho de presunção afíbia.

Tortuosamente esculpiu sobre mim um mausoléu ao meu pomposo otimismo, se é que se pode dizer assim. Sobre mim abate-se tão somente a “perspectiva zero” do amador. Nada há em mim e sequer nos conhecemos.

Sem que possa compreender e protegida pelo anonimato a megera sabe que vi o plâneta vênus sobre o abacateiro do quintal infestado de pirilampos em 2004, e de que também possuo disposições para mirá-lo novamente em 2012. Acerta. Sem jamais ter por mim um sentimento sequer de aventura intelectual. Eu simplesmente não presto.

Pois fique sabendo que estou agradecido e feliz quanto ao sarcasmo de revezamento empregado nessas páginas de longos trechos quilometrados. Aceito compartilhar a minha estrada com mais um animal de carga para subir as montanhas mais altas. Prometo me dedicar inteiramente a agricultura e a pecuária. Cultivar o meu capim com o melhor dos meus arados.

Com todo este menosprezo nada haveria de esperar senão aquela surpresa típica de todas as cronicas de almofadas. A criatura que me detesta em teoria vai ajeitando o verbo espinhoso na prática até traçar um quadro em que dispõe de vantagens para uma bebida quente além de afagos numa noite de lua...

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Ficção virtual. Qualquer semelhança com a vida real é mera coincidência.