Meus desenhos

O meu fascínio pelo traço, pela forma, cor e contorno, como expressão de vida e conhecimento sempre estiveram presentes , desde a minha mais remota lembrança.

Desenhar é se expressar acima de tudo, sem palavras , sem gestos ,sem corpos, apenas traduzindo de dentro para fora. Desenhar bem é apenas detalhe, é o que menos importa.

Quantas e quantas vezes na vida me expressei através do desenho, pela ironia da charge, colocando no espaço em branco sentimentos reprimidos, e as vezes até debochando de situações ridículas, ou mesmo de atitudes que via a minha volta. Era um apelo a me decifrarem, a me perdoarem pelas audácias e sarcasmos, pelas imperfeições e pelos ângulos de perceber as coisas.

"Meus desenhos" convida e mostra o melhor de mim, de cara lavada, meu lado mais sincero, poético, nostálgico, e sensível. As cores e o nanquim, são o alegre e o escuro, faces da vida, os momentos de intensidade que merecem o registro pela forma.

"Meus desenhos" não tem boca, não se calam, e nem se tocam, e as vezes ferem por mim, e através de mim, debocham por mim, e nunca se tocam, são expressões reprimidas, o conteúdo abstrato quando se deseja, e o retrato concreto quando se permite.

A música traz a tona a infância, a sua côr e a sua dor, os sonhos aparecem quando digo que são à lápis e são a "pluma" ( caneta em espanhol), e os traços da candura que estão no ato de pintar e de viver.

O gosto da salmoura, é o " mar-oceano", como o chamavam os antigos navegadores ibéricos, e coloca o choque cultural, a saída das origens e suas margens no papel, a alma sem tréguas e sem definições.

Apesar desta letra tão intimista e singular, é uma letra de paz e perdões, que também reverencia as coisas novas que vieram, e traça uma aliança , uma luz ,mesmo que não me pertença, pois não há o que me pertença. A vida vista de cores e sombras, o branco e o negro, e a semelhança nas diferenças . "Meus desenhos" é uma poesia de reverências, e remissões, uma infância bela e doída, mas muito intensa.

Esta canção está em "Lá menor" , e conta várias passagens em "Dó menor", ( o acorde preferido de Beethoven ), que é um acorde que pede atenção a quem o ouve, e é de fato um acorde muito bonito, pois fala por si.

A canção me deu trabalho e não se fechava , e eu não desistia dela, e me esforçava ao máximo, montando mentalmente o quebra-cabeças, até que foi se encaixando , sem faltas ou sobras, e das mais de setenta canções, esta é a que considero a melhor em sua harmonia.

"Meus desenhos falam por mim,

Meus desenhos falam por mim...

São rabiscos, são feitiços,

São de cera, são de giz, (2x)

Tem crianças, e tem varandas,

Que não se apagam da lembrança

São murmúrios, são cobranças,

São as cores e o nanquim,

São as cores e o nanquim...

Meus desenhos, não tem boca

Não se calam, e nem se tocam

Tem o gosto da salmoura,

São pedaços que perdi,

São pedacinhos de mim...

São loucuras e aventuras

Fantasias e travessuras,

São à lápis e são a "pluma",

São os traços da candura

Que caminham lado a lado,

Entre a tinta e a cor,

Entre a tinta e a cor...

São pedaços que perdi,

São pedacinhos de mim...( +1)

Meus desenhos falam por mim,

Meus desenhos falam por mim..."

Quando saí da "Ford" os meus colegas me prestaram uma homenagem e refletiram no painel a letra desta canção, assim como muitos dos desenhos que fizera, e que eles guardam até hoje, e fui explicando cada um deles enquanto eram projetados, e alguns eram muito engraçados, satirizavam pessoas e situações comuns de escritório, e fiquei feliz por fazer feliz, rompia o rigor da rotina e de certa forma humanizava um pouquinho o ambiente.

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 12/08/2014
Reeditado em 21/03/2018
Código do texto: T4919243
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