Tantos Amores Em Um Mesmo Amor

E são milhares de milhares que caminham sobre a Terra fingindo buscar sucesso, glórias, fama e riqueza, mas mesmo os desbravadores de vida que alcançam suas almejadas ambições buscam o esperado e sonhado amor.

Uns acreditavam tê-lo encontrado e eis que o tempo senhor da razão revela os enganos ocultos das primeiras falsas impressões... Outros mesmo que consoladamente acompanhados ainda buscam o amor inflamado que retira o ar sem perceber-se que ao seu lado pode estar quem lhes roube suspiros...

O amor banalizado em canções de sofrimento e dor dilacerantes de corações partidos e decepcionados torna o amor de hoje apenas forma de expressão que demarca uma intensidade emocional entre pouco menos que paixão e um pouco mais que atração.

E há quem me pergunte se busco também pelo amor... Eu não canto este amor, pois não sei cantar e não sei amar... Desisti da busca quando meus próprios olhos puderam constatar em olhinhos inchados de derramar lágrimas e semblantes caídos de que o amor que busco desapareceu da face da Terra e ninguém se percebeu disso enquanto buscava-se por ele... Está em extinção o Amor...

E há quem me diga o número exato de pessoas conhecidas que amam ou até narram seu próprio testemunho de amor precoce, mas já eterno... E eu que desisti de buscar o amor respondo com convicção que rejeito esse amor e dispenso-o.

Não busco este amor que causa prantos, pra isso existem as cenas da vida que causam grande emoção. Não busco o amor que causa dor, já existe dor o bastante vida à fora em todas as suas maneiras diversas. Não busco o amor que causa sofrimento, pois basta-nos estarmos sujeitos a doenças, males do século, desgraças e todas as formas de violência. Não busco o amor que se faz dono, já somos escravos de tudo o que contém na rotina diária e de outras coisas que não se pode perceber com clareza.

Sim, eu posso ver quantas pessoas estão amando... Elas rolam pelo chão ou em camas cobertas de pura seda sussurrando a intensidade de sensações únicas que o toque malicioso pode proporcionar... Minha ignorância chama isso de puro sexo ou necessidade puramente fisiológica instintiva e presente em todos os animais.

Sim, eu vejo pessoas que amam... Reclamando a ausência sem questionar-se se algo mais sério do que deixar de dar a devida atenção, pode ter acontecido. As pessoas não conseguem deixar cada volta ser uma grande satisfação. Minha ignorância chama isso de Egoísmo.

Vejo as pessoas que amam... Chorando os cinco dias que não vê, não toca, não beija sem notar todo o resto de coisas magníficas que causam tantas emoções iguais ou mais fortes, lamentando-se e chorando nestes cinco dias por alguém que pode estar percebendo como a vida tem outras coisas a oferecer. Minha ignorância chama isso de escravidão.

Dispenso esse amor, muito obrigada! Esse amor é tão terreno e superficial quanto tudo mais que existe neste mundo, mas difere das demais coisas, pois não sofre transformações ou progressos, e sim alterações exaltadas e regressos. Iguala-se por ter um prazo de existência quanto a tudo ao nosso redor, e mais cedo ou mais tarde acaba.

Não, rejeito esse amor fraco, que depende do tempo, de estações, de estímulos... Desmorona a qualquer tremor instável e treme diante das adversidades. Rasteja, implora, suplica por algo que não se pode pertencer, ter dono, ser rotulado, aprisionado, isolado...

O amor que busco está em extinção nesta terra... Ele não é minha exclusividade: ama o sexo oposto, o mesmo sexo, ama amigos, ama família, ama os outros seres, ama todas as formas de vida de igual para igual e vê o mesmo valor em todos eles, só trata cada um de modo diferente, pois representam coisas diferentes.

O amor que preciso não enxerga minha face e meu corpo, e o toca por conseqüência do desejo de misturar-se à minha alma que é a única coisa em mim que pode enxergar.

O amor que quero atravessa o tempo, não morre, não acaba, não degenera, não desgasta, não sucumbe, não causa dor, não me faz sofrer, não se limita, não faz de mim o centro de seu universo particular, não me quer escrava, nem objeto, nem dependente...

Não quero o amor que chore por mim ou que me faça chorar... Quero o amor com um sorriso escancarado na face resplandecendo luz... Quero o amor que solte escandalosas gargalhadas quando pronuncio minhas graças e tudo mais que me faça rir...

Não quero o amor meloso, grudento, colante, adesivo, que me segue e me acompanha como se fosse um guarda-costas ou um cão de guarda que precisa se assegurar que meus olhos não enxerguem outras pessoas, outras belezas e se encante com outra coisa. Ou que precise desfilar comigo a tira-colo como que exibindo um troféu que auto-afirme sua masculinidade viril e capacidade em conquistar tudo o que quer. Quero um amor livre, leve, solto, vivo, desprovido, descabido, despojado!

Não quero o amor que não saiba que para tudo na vida existe um momento certo... Que não respeite o fato de que preciso me inclinar para as demais coisas que a vida me oferece de tão bom grado. Que seja tão convencido a ponto de acreditar que é a melhor coisa que pode ter me acontecido a ponto de eu ser obrigada a enxergar nada mais, nada menos do que esse amor.

Não quero o amor que me faz escrava de carinhos e sensações prazerosas momentâneas para minha carne corruptível, sendo que até eu mesma posso manifestá-las. Não quero nada que me vicie cada vez mais em tudo que quero renunciar em meu corpo e que mata, eu sei, cada vez mais minha Alma que tanto prezo. Não quero um pouco de carinho em troca de beijos, não quero umas poucas palavras bonitas em troca de atenção.

Não quero o amor que premedite quando irá tomar-me em seus braços: teatro e ópera, jantar em um restaurante requintado, um passeio pela cidade, uma parada para contemplar as luzes da cidade e a Lua, e cama! Não quero o amor que me veja como um objeto, um utensílio...Quero o amor da naturalidade que permite tudo acontecer na hora que deve ser... Que se sinta bem: apenas juntos, apenas juntos e mudos, apenas juntos e conversando sobre qualquer coisa, sem segunda intenção, sem trocas, sem reprimir o sono por ser preciso oferecer uma recompensa.

Não quero o amor que vasculhe minhas coisas tentando descobrir meus segredos. Nem o que passe algumas horas do dia pensando se penso nele, ou sinto falta, ou sinto carência. Um amor que deseje que eu me sinta carente é pequeno, pois o amor que quero completa, satisfaz, se basta. Não, quero o amor que se fascine com meus mistérios e espera pacientemente pelo dia em que revelarei meus segredos, algo em mim novo pouco a pouco...

Não quero o amor que seja minha metade: eu estou inteira! Quero um amor inteiro, completo. Não duas metades que juntas se completam e ficam enganosamente inteiras, mas que junto sejam complemento. Não quero completar ninguém, quero complementar, acrescentar.

Não quero o amor que me cobre e me diga qual parte me cabe e o que devo fazer. O amor que quero me aceita como sou, gosta de tudo o que eu faço, surpreende-se com o que posso fazer, maravilha-se com meus sonhos, apoia-me em meus projetos mesmo que eu desista deles na metade, que me impulsione a continuar, que fique feliz com minha felicidade, que se alegre por eu estar alegre, que sorria quando eu chorar, que compreenda minhas limitações e superações... Que me deixe livre para ser o que sou, a aprecie meus vôos do mesmo modo que aprecia os vôos dos passarinhos, que veja pelos meus olhos que o que considero valor realmente me é valor.

Não quero o amor que me faça abrir mão de algo, principalmente de algo que tanto esforço exigiu para ser conquistado. O amor que quero não apenas me aceita, aceita minha vida, meu modo de viver, minhas cicatrizes, minhas histórias, meus momentos tristes, minhas frustrações, minha personalidade assim como é, meu fracasso não somente minhas vitórias, meus tropeços...

O amor que quero, me olha nos olhos como se desejasse que a eternidade se fizesse naquele instante... Olha-me como se eu fosse a invenção mais incrível dos últimos tempos... E sempre que chego, mesmo que ausente por uns minutos me olha revelando aquele brilho como se fosse sempre a primeira vez...Rouba-me um beijo de surpresa... Faz-me suspirar de tanto contentamento...Abraça-me e fica assim por longo tempo, pois esquece o tempo...

O amor que quero não se faz meu proprietário, meu dono, meu senhorio... Não limita meus passos, meus olhares, minhas emoções, meus pensamentos e não fica inseguro se me pega pensando demais, ou com o olhar fixo no nada ou precise ficar só... Aprecia o fato de que amo tudo e todos, não se enciúma quando demonstro amor e carinho por outro ser. Ele trata cada um de modo honroso, pois sabe que tudo que possui vida é um milagre. Não mede ninguém pela classe social, a aparência, a popularidade...

O amor que quero e não necessito seria um espelho onde ao olhá-lo, veria a mim mesma refletida... Não alimentaria meu ego, mas assim como eu, tentaria matar o seu... Cederia-me seu melhor sem esperar nada em troca, pois tudo isso que tanto quero é tudo o que daria.

E não busco o amor! Eu não preciso dele! Não o quero!

O Amor que quero já existe! Eu não acredito no tempo e no espaço, e ele de certo está em algum lugar no tal passado ou futuro ou até mesmo no agora... Nesta terra ou em outra... Amando-me sem saber quem sou, mas acredita e sonha comigo e pela simples satisfação de me amar e por eu simplesmente existir, não importa onde nem em quem. E assim o amo: pois está livre, está fazendo o que gosta, não precisa assumir um compromisso, não é cobrado, não é exigido, nem rotulado e está seguindo seu curso...

E as gentes seguem sofrendo e gemendo em busca do amor... Esse amor que está disponível em qualquer momento de solidão... Que substitui e serve como fuga... E que esconde e ofusca o verdadeiro Amor que na verdade, está dentro de cada um de nós.

São Paulo, 26 de Janeiro de 2009.

Shimada Coelho A Alma Nua
Enviado por Shimada Coelho A Alma Nua em 26/01/2009
Reeditado em 26/01/2009
Código do texto: T1404811
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