Máscaras: trair e atrair

Um poeta dizia que o nosso maior desejo é ser desejado por alguém. Acompanhando esse pensamento, quero tratar nesse texto de uma maneira subjetiva da atração e seu maior risco, a traição.

Trair é fingir, fingir é fugir de si mesmo, divorciar-se da própria identidade rompendo com a sinceridade pessoal e com a natural alteridade.

Semana de Carnaval, tempo de máscaras. O que se percebe é o quanto o povo de si se esquece, querendo assumir o que não se é para quem sabe talvez, conquistar o que e quem se quer.

Atrair com base na traição não convém, não há um profícuo bem, a atração não existe a não ser que por falsificação. Feridas grandes que se criam a partir do verniz que se coloca. O verniz dá brilho e tudo mais, mas muitas vezes é colocado somente para suprir lacunas qualitativas à madeira.

Não é preciso se trair para atrair. A atração verdadeira que não é passageira é aquela que cria raízes no solo da sinceridade do ser. É sendo quem se é, na tranquilidade de deixar-se conhecer sem o medo do não-desejo e desprezo, que se consegue atrair o outro para o nosso centro.

A atração que falo não é a banal, mas a cordial; aquela que seja uma porta de entrada para o outro adentrar em nosso coração e tornar participante de nossa vida, fugindo daquilo que tem caráter provisório e que contenha superficialidade.

Sim, a máscara chama atenção, pode atrair a muitos, mas não atrai a todos. Ela é colocada no carnaval, mas em alguns ela permanece durante anos. E quando o carnaval passar? Para muitos a quarta feira de cinzas nada significa, não entendem a mensagem de que somos pó e cinzas e parecem querer continuar a usar por mais tempo a máscara.

No poema Tabacaria, o poeta português tão bem expressou ao falar de alguém ou de si mesmo: "Fiz de mim o que não soube e o que soube não o pude fazer (...) quando resolvi tirar a máscara vi que estava envelhecido (...). A máscara falsifica o nosso perfil, nos envelhece, nos engana, mas muitas vezes isso tudo não se percebe pelo simples motivo da ilusão, onde as emoções provisórias e irreais nos traem. A intenção não tem atenção quando a máscara tende a tampar as nossas misérias e ainda dar uma outra imagem de nós mesmos.

Fingir é fugir da realidade que é chão para alcançarmos os nossos sonhos, os nossos ideais. O eu real é quem permite o alcance do eu ideal, na contínua e fatigante busca de ser melhor, de crescer. Isto porque não devemos nos contentar com aquilo que somos, devemos sempre mais querer ser melhor. Pois como dizia Guimarães Rosa: "o animal satisfeito dorme".

Não devemos fugir daquilo que somos mas também não devemos erguer nosso eu como a um troféu, na satisfação de quem acha-se pronto e imutável. Não, nada de "espírito de Gabriela": Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim... É muito mais louvável a busca e o esforço natural do que o comodismo ocioso em colocar a máscara e resolver tudo como a uma mágica.

Quiçá as máscaras pudessem ser tiradas ao término do Carnaval e assim, todos pudéssemos viver sob o regime da sinceridade. Trair e ser infiel é também sinônimo de infelicidade, tenhamos o devido cuidado com o Carnaval temporal e sobretudo com o Carnaval que insiste em querer continuar.

Hudson Roza
Enviado por Hudson Roza em 07/02/2010
Código do texto: T2074150
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