A sede

Era uma vez um homem perdido no deserto que, há dias procurava sedento por uma fonte, um poço, uma gota de água que pudesse prolongar-lhe a vida por alguns minutos que fosse. Nesse percurso, já nem se lembrava para onde estava indo, apenas se preocupava em encontrar a seiva que lhe garantiria as forças para continuar a caminhada. Enquanto andava, movido pela sede, alguns flashs lhe importunavam a mente, lembrando de águas que já lhe haviam saciado, lhe refrescado, proporcionado prazer, bem estar e ás vezes até incomodo e infortúnios e, por vezes, sentia saudades e tristeza por não ter apreciado com mais atenção essas gotas de benção.

Durante o percurso quente, castigante, sofrido, ele desejava a água, que lhe aliviasse o sofrimento. Encontrou barro, e sorveu o pouco de umidade que ali havia, e se alegrou porque ali aliviou a sua sede, mas aquilo não era água na sua mais pura forma e, assim que aliviado, abandonou o barro e seguiu seu caminho em busca do líquido. Depois de mais algum tempo de caminhada, encontrou uma planta que, ao ser cortada, liberou um líquido aquoso que molhou a boca do homem e aliviou mais um pouco sua necessidade, mas, novamente assim que recuperado um pouco do frescor, lembrou-se que na verdade, aquilo não era a tão desejada água e pôs-se a caminhar, deixando para trás a útil planta.

E, assim foi-se fazendo o caminho, encontrando os mais variados líquidos que proporcionaram a chegada do homem até um vilarejo, onde logo foi acudido e lá, percebeu decepcionado que ali também não havia o líquido cristalino que tanto buscava, mas aquele povo aprendeu a viver com as mais variadas fontes de líquidos, por vezes barrentas, com algum gosto, mas sabendo que aquela era uma benção, era o que precisavam e o que estava ao seu alcance. Eram gratos e felizes. Tratavam os mananciais com todo o respeito e cuidado. Só então o desiludido caminhante relembrou seu primeiro intuito. Partiu um dia em busca de um sábio que lhe ensinasse qual era o real sentido de sua vida e qual a fórmula para ter uma vida feliz. E, sem que nenhum sábio lhe dissesse, ele mesmo concluiu que uma caminhada se faz a cada passo, e se quisesse chegar ao mais alto e distante monte, a pequena (e aparentemente insignificante) pedra sob seus pés tinha um valor inestimável para sua caminhada. Entendeu que a felicidade está em valorizar e reconhecer que cada pessoa, cada momento, cada circunstância em sua vida são bênçãos que trazem alegria e aprendizado, ajudando a construir o caminho.

Assim fazemos todos os dias, sedentos que estamos, esquecemos o nosso real objetivo, nosso real compromisso de vida, e seguimos em busca de água, de algo que nos garanta ter forças para continuar vivendo, um amor, um trabalho, um filho, uma casa, um projeto, e, ás vezes, esquecemos de dar o devido valor a esses degraus que nos fizeram chegar até o poço transbordante de nossas conquistas ou, insaciáveis, logo resolvemos sair em busca de uma nova fonte, uma nova alegria, deixando para trás o que nos era importante e realmente necessário e merecido. Sigamos em frente, mas nunca sem olhar para os lados.