O SOFRIMENTO,QUEM INVENTOU ?


Que poderemos responder, quando alguém nos indaga: "quero falar do evangelho, levar a salvação para uma pessoa atormentada, portadora de enfermidade incurável, revoltada contra Deus por permitir tanta desgraça no mundo, que faço?" Crianças morrem de fome, de doenças endêmicas que persistem em vários lugares do mundo; pessoas inocentes morrem, são mutiladas em guerras civis; pessoas com doenças socializadas, como o câncer, a AIDS, as hepatites de todas as letras, por exemplo, sucumbem diariamente e são levadas à morte... Se concedermos espaço, poderemos ouvir a descrição de algumas centenas de males e situações que denunciam dor e sofrimento, e não terminaria a denuncia das desgraças do nosso universo físico.

Somos vítimas e contribuímos ao mesmo tempo para o sofrimento, onde vivemos. Temos responsabilidades mútuas, e as exercemos, principalmente se tentarmos apontar os problemas da moralidade nas políticas públicas que deveriam responsabilizar-se pelo sofrimento de tantos cidadãos e cidadãs, em tantas partes do mundo. Será, mesmo, que foi Deus que inventou o sofrimento, ou talvez o permite, quando inocentes são atingidos ou estão impotentes diante do mal e das des-graças do mundo? Será que Deus escolhe "pecadores" para imputar sofrimento, e "não-pecadores" para isentá-los do sofrimento e do mal? Gosto muito de Thomas Merton, mestre da espiritualidade, que escreveu: "Nenhum Homem é uma Ilha", o título diz tudo...

Há perguntas, também, que deveriam ser feitas diante do propósito de explicar a dor, para interpretá-la à luz da fé. O sofri­mento aparece estreitamente vinculado ao mal, sempre. Supõe ingredientes de culpa e casti­go, pecado e rebeldia, e principalmente, interpela um “deus” que se apresenta a si mesmo como justo e bom, em medidas perfeitas, contra um homem que é justamente o contrário. Se uma pergunta pode resumir todas as interrogações, seria esta: "Por que, Senhor, tanta contradição nos relatos de Tuas ações?”. Com efeito, as voltas da reflexão acerca do sofrimento nos levam ao próprio princípio de nossa compreensão cristã da solidariedade de Deus. Se quisermos aproximar-nos do que a Fé nos ensina, o texto bíblico de Jó é referência obrigatória para a questão do sofrimento.

E Jó descobre que Deus não é responsável pelo mal e pelo sofrimento! Quem conta a história deixa a imaginação solta, usa a linguagem religiosa que gosta dos símbolos das forças antagônicas que lutam dentro de nós, humanos que somos. Não se trata de forças externas, acima do nosso mundo real, que travam batalhas incríveis para oprimir e dominar nossa natureza. Jó é um homem transpassado pelo sofrimento que pergunta sobre o mal. O texto paulino de Filipenses (2,6-8), sobre o esvaziamento da divindade que, com o despojamento divino, no entanto, torna o Senhor Jesus Cristo Deus Solidário que experimenta o sofrimento da humanidade na carne, como todo homem e toda mulher, aqui e em nenhum outro lugar, causa um choque em quem quer uma solução milagrosa para a dor. É um texto definitivo! Para muitos, essa afirmação é mais escandalosa que as perguntas e as dúvidas de Jó: Deus não poderia ser assim, humano, vulnerável, tão atormentado como qualquer mortal! É demais para o entendimento, dirá Paulo. A cruz é um escândalo!

É bom refletir um pouco... O exemplo clássico diz que Deus “consente” o sofrimento no mundo e não fala sobre a sua origem. Os Escritos Sagrados, no entanto, no geral, dizem sobre as escolhas humanas. Somos nós, homens e mulheres, que “inventamos” e produzimos o mal e o sofrimento. Temos responsabilidades no cartório, no mínimo por conivência ou apatia. Pior ainda, se atribuímos a poderes terceiros, diabos, demônios, forças do mal, escolhas que na verdade são nossas. Não nos redime. Não explicam nada da nossa realidade. Ao contrário, transferem nossa necessidade de decisão sobre o que nos oprime e faz sofrer.

A presença do sofrimento é uma constante, com o açoite na consciência que intensifica a dor moral: “É o pão que nunca falta à mesa... Onde esti­ver o homem, ali estará, como uma sombra, o sofrimento” (Larrafiaga). Mas, longe de aceitá-lo com naturalidade, entendemos que o sofrimento é inimigo, escândalo atentatório à condição humana, e adversário do anseio de liberdade dos homens e das mulheres. Conseqüentemente, o sofrimento nos força a uma dupla tarefa: enfrentar sua crueza imediata e, além disso, se convertido em an­gustiante problema humano, racionalizá-lo em busca de explicação. Finalmente, o sofrimento exige decisão de nossa parte. Qualquer que seja o modo possível, é preciso buscar a superação de tudo que o representa. A inteligência da fé é chamada ao palco da tragédia humana com o crisol do Evangelho da Graça que sanar todas as dores e sofrimentos humanos. Mais uma vez, a responsabilidade é nossa. Jesus Cristo, Deus Solidário, esvaziado de poderes sobrenaturais, identificando-se com a nossa luta, percorre conosco o caminho do sofrimento. Até que venha "um novo céu e uma nova terra" (Ap 21): o Reino de Deus. A salvação do mundo sem sofrimento não é uma mensagem evangélica. A fé cristã não é uma propaganda do "mercado da felicidade", mas a denúncia dos significados dessa propaganda.
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retirado do site www.paoquente.gov.br
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