Onde estou?

Hoje preferi escrever ao invés de falar. Sempre, a voz me sai pela boca de maneira muito simples e fácil, todavia hoje, seria muito complicado alinhar a ordem de meus pensamentos,coordená-los e enfileirá-los de modo a fazerem sentido para quem os ouviria.

Não consegui pensar em melhor forma para tal do que colocá-los no papel, pois, assim, ficariam todos registrados e nenhum se perderia em meios a convulsões linguísticas.

Noto que, ter deixado meu paraíso particular, tirou algo de mim que somente hoje percebo. Arrancou de mim minha vontade de ter compromisso comigo mesma. Rasgou-me em dois. A profissional está intacta e voando como uma águia jovem e repleta de energia. A pessoal se perdeu em meio a um turbilhão de fatos, acontecimentos, sentimentos e desceu pelo ralo indo ao mais profundo caminho das águas e misturando-se à corredeira de um rio que desagua no mar em direção ao grande oceano.

Batalhei para encontrar um novo paraíso e me iludi com a esperança de que algo como este pequeno e aconchegante recinto me acalantaria. Doce engano cometido. A ilusão ou esperança de que me encontraria e me sentiria segura e aquecida foi bruscamente interrompida mostrando-me uma dura e cruel realidade: o vazio está ainda maior. O frio gela minha alma que corta como lâminas afiadas os meus pulmões.

Não me vejo dentro deste lugar. Não me vejo em lugar algum. Não me percebo comprometida comigo mesma. Não enxergo onde estou.

Noto que me perdi de mim há muitos e muitos anos. O caminho único encontrado foi aquele que me restou e, tenho consciência neste exato momento que, é o que me salva.

Há pouco mais de um ano, minha função de cuidar do outro, como pessoa, foi esvaziada. Meu filho de 48 anos morreu. Deixei-me escapar como um balão de gás hélio que se esvai céu a dentro.

Questiono-me onde me reencontrarei. Não encontro resposta. A comida, a bebida, as atividades e passeios foram se transformando em atos e, não mais, em prazeres.

Será que encontrarei um lugar para chamar de meu ou será somente mais uma ilusão? Afinal, as ilusões viram elefantes brancos e deixam de fazer sentido.

A síndrome do final de semana, que já existia desde tenra idade agora, se transformou em um trauma. O trauma da quinta feira. Eu nunca compreendi como a quinta feira sempre me era tão pesada. Hoje, percebo o real motivo: está a chegar o final de semana e eu não tenho como me esconder na jornada de trabalho, em minha tábua de salvação eterna e, não mais, momentânea.

Agora me pergunto: o que farei com esse lugar aconchegante que não me vejo inserida?

Bia Fernandes
Enviado por Bia Fernandes em 05/10/2021
Código do texto: T7357433
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