POETA DE RUA

Um poeta culto e nordestino, na praça de Copacabana

mostrava o seu verso, contrafeito e reverso

para a turba ignata, que pouca atenção lhe dava.

Mostrava o poeta na praça, o seu estupor.

É a verdade que o poeta verseja, desejando

acercar-se das coisas, e com todo o seu ardor

dimensiona-las no lírico.

Mas quem quererá a verdade?

Mesmo assim, ele não quer pouco.

Só a gloria, almeja. Os cabelos vão voando

ao vento leste, enquanto na praça, ele tenta

vender o amor por seu tema.

Amor e vida, trançadas nas rimas.

Morte e vida Severina, visceral cabra-da-peste.

Mas o povo passava apressado

querendo alcançar no horário, o folhetim da televisão

correndo contra um tempo que não tem.

Passava e olhava, e olhando, alguns lhe falavam

cheios de comiseração: “Sai das nuvens, amigo poeta”

e não lhe davam vintém. O poeta não percebia

não se via ali vivendo o anti-herói de um poema patético.

Passa, rente, o coletivo. Passa o cão e o transeunte.

O jardineiro acolhe a flor tísica

e o poeta heróico ainda tenta na praça

vender poesia para o povo, em secos versos

enquanto o diverso o maltrata.

Ricardo S Reis
Enviado por Ricardo S Reis em 29/05/2007
Reeditado em 04/06/2007
Código do texto: T505869