MINHA POESIA IMPURA

Minha poesia é impura

retraída

Não tem nada de excepcional

É um mal. Para mim necessária

Até a acho meia otária

Quando se retém diante de panelas literárias

Ou quando pensa nos cânones

Nos grandes nomes

Nos grandes estetas do País

Como se só estes fossem “poetas”

Mas ela logo se recupera

E sai por aí falando besteira

Rimando tudo em ar

Rimando amor e dor

Como se fosse isso a última novidade

Minha poesia é impura

Só bebe em fonte contaminada

Só se identifica com poeta maldito

Ao erudito despreza

Prefere a reza d’um cantador nordestino

Respira São Paulo

Nasce na jusante do Rio Tietê

Tropeça em mendigo

Em criança explorada no semáforo

Minha poesia é impura

Solidária solitária

Não tem guru ou leitor assíduo

É uma nódoa no brim

Flexível como o bambuzal

Não cabe num soneto

Quadrinha sextilha

E nem na rigidez de um cordel

Enfim não é nada

Mas expressa o quer

Como der e puder e vier

As vezes nem sei o que é

Um desabafo/ desacato

É um cutucar fera com letra pouca

Um escrever reto com idéias tortas

Um trem fora das linhas

rilhando por aí, assim:

Em desafio, por desfastio

Para não entalar na garganta

Desentoxicar-se

Desencanto

Enfim, um canto solo.