AS FLORES DA TARDE



Caminhamos numa estrada já muito pardacenta
e a poeira se apega e dança
em torno dos nossos pés no solo endurecido...
Somos lendários gigantes colhendo
as derradeiras flores nas margens dos caminhos.
Ali estão as camélias esquecidas,
as valerianas tímidas, os cravos de uma tarde que se alonga
nas rajas incendiadas do horizonte.
Ali estão as orquídeas
como meninas em balanços no frescor dos bosques.

A relva colorida, nos dias claros e orvalhados,
suaviza as dores costumeiras do nosso andar,
abranda as calosidades, umedece as rugas, alegra os olhos.

Caminhamos...
O sul, o norte, que diferença faz?
A tarde sempre nos convida
para o último chá. A senhora do barco nos sorri atrás da porta.
É tempo, diz ela, é tempo.
Persistimos, contudo, em apanhar mais flores nesses trilhos pedregosos.
“Mais um pouco, senhora, mais um pouco...e então iremos.”

Não importa o leste com seu vento, sua brisa, sua sedução azul.
Não importa a travessia brilhante e branca para o oeste.
Ainda há flores a ser colhidas
em todas as direções.

Haverá ainda encontros programados para a vida e para o vinho e para a canção.
Haverá ainda momentos de sorvetes, de conversas, de risadas,
de casos antigos a serem rememorados,
de lembranças nítidas que as águas dos dias não desbotaram
e que estão ali, num asilo dócil da mente e do coração.
Haverá ainda minutos de oração e de mãos dadas antes do barco passar.

Continuemos caminhando...
O jardim do tempo nos convida para seus perfumes...


Sidnei Garcia Vilches (30/07/2014)