Ar condicionado

Nas barbas grisalhas do tempo,

inscrito com o branco cinzento do solo,

sigo como o verde que cumpre o rito do outono.

Percorri, pois, aquela tarde insólita

Eu estava só!

Segurava (com devoção)

a mão da última sombra

que o fim do pôr-do-sol produzia

Dancei as notas infaustas

de uma canção antiga

A voz não me chegava mais ao coração

Mas declamei alguns traços poéticos

de um autor desconhecido

e juntei uma pequena vida que restava

nos galhos secos

e nas folhas soltas pelo quintal

às rimas do poema que acontecia.

Senti...

Chegou o inverno, enfim

Parei de absolver o pólen daquela flor culpada

que ficou da última primavera.

No pulmão dos quatro cantos do meu coração

Hora de respirar!

Sentindo a paz de cada molécula registrada

no suspiro da saudade

Vinha devagar...

Aspiração e expiração em devaneio

Solidão circunscrita, circundante

de um ar condicionado!