Malabarista das esquinas

Na corda bamba do Brasil

Sou malabarista profissional

Todo dia vendo minha arte no cruzamento

Artista

Compro meu dia a vista

E pago a prestação

Respiro poluição

Morro de bala e desnutrição

E renasço sempre com fé esperança

Pago dízimo e jogo no bicho

Arrisco minha vida na saúde pública

Na fila de Previdência

Nessa dança não me canso

E volto sempre

E voto sempre

Na esperança prometida

Rezo na missa

Peço o pão de cada dia mesmo com bromato

E roubado do peso

Quero e reivindico o leite Z do governo

Filho na escola

Mesmo que não aprenda e só assine o nome

Somos o que se come

Sonho sempre acordado e vivo no pesadelo

Na corda bamba do Brasil

Penso noutra forma de respirar

Que não doa tanto

Uma saída: terra pão e tesão

Ar mais puro

Auto-gerir

Autônomo

Mas no fundo me contento:

Hoje tenho ovo frito e verdura agrotóxica

Água sem tratamento

Mas não lamento

Agora

Ter lazer e cultura seria luxúria

Mais que Rede Globo novela...

Sei que não sou bobo. Só desproteinado

Não tenho raiva de nada

Só sonho e penso e e preciso

De um País melhor e um governo mais sério

Um risco

Na corda bamba do Brasil

Sempre me deparo com o abismo

E a corda extendida à frente

Todo dia tomo com paciência:

Ignorância e emburrecimento

Lamento e grito em dia de futebol

Boto os bicho pra fora

Isso não é lamento é só filosofia vã

Pois ninguém de ferro

E são tantas as possibilidades abertas

Para a próxima encarnação

Rumo todo dia para o futuro

Duro

Sem tostão

Fico no frio da noite

Mas sonho recorrente

Quero maré-mais-mansa

Livre da condição de sub-sempre

Desempregado

Capataz diplomado

Empresário aterrorizado com a taxa de juros

E volta da inflação...

Aflição

Juro!

Se sonhar junto é realidade... Cadê o paraíso?