UM POEMINHA AMAZÔNICO

Abortado na beira do rio,

O menino metade peixe, metade jacaré

Nunca imaginou ser poeta

Nunca sequer tinha ouvido falar de poesia

Aprendeu a virar gente fazendo farinha

Teve que abandonar as nadadeiras

E trocá-las por braços pra poder

Agüentar o trabalho escravo da roça

Teve que trocar as patas de jacaré

Por patas de gente pra se manter firme

Sob o paneiro, sob a saca de mandioca, sob a vida

E aprendeu a fuçar o chão quando tinha fome

O menino metade peixe metade jacaré

Agora era metade gente, metade porco

No meio das pedreiras e vitrais.

Tinha que tomar banho de lama

Perto do cais pra suportar o calor infernal dos trópicos

E caminhar invisível por entre as pessoas feito camaleão

Depois que assumiu um aspecto pálido esverdeado

De quem passa fome e só come porcaria

Já não se podia distinguir se era um homem ou uma mulher

Sob os trapos e sacolas que perambulava pelo centro da cidade

Comendo junto com os cachorros e pedindo pinga

Nos botecos que circundavam os puteiros portuários

A cidade aprendeu a se assustar com aquele

Que era um de seus moradores mais antigos

E que agora sujo ficava gritando palavras

Confusas e difusas nas Escadarias dos Remédios

Encenando obscenidades com as mãos

Enquanto as pessoas iam e viam do interior do estado...

Rojefferson Moraes
Enviado por Rojefferson Moraes em 16/03/2011
Código do texto: T2851728
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