Canto de encanto (Aos poetas)

Encanta-me

O poeta que, até sem rima, faz um nascer,

Foge da cópia, da coleira: "Que o verbo grite,

numa linha ou palavra que a alma dite,

ou morrer!"

Canto de encanto

Lizete Abrahão

Encanta-me

O poeta filho da coragem e do luar,

Que não teme transgredir e revoluciona,

Não conta sílabas, apenas emociona,

Quando quer fazer o mundo sonhar...

Encanta-me

O poeta que se constrói anarquista,

Vive à margem de um mundo dito certo,

Olha profundo e vê muito mais de perto

Tudo que anula o mundo perfeccionista...

Encanta-me

O poeta, aquele que sabe discernir

Certo de errado e o vazio de uma forma,

Quando um dito vate agoniza na norma

E morre sem saber o que é transgredir...

Encanta-me

O poeta do verso mais que perfeito,

Quando o buril toma, vezes infinitas,

No lapidar palavras, pedras malditas,

A construir na poesia o seu leito.

Encanta-me

O poeta que dorme na cama das estrelas;

É dentre o seio delas que tange a lira,

Desdenhando que vida ou morte lhe fira;

Mais importante é ir aos céus para vê-las.

Encanta-me

O poeta que, até sem rima, faz um nascer,

Foge da cópia, da coleira: "Que o verbo grite:

Que em cada linha, em cada letra a alma dite

O som e a cor do meus versos - ou morrer!"