E eu que era tudo ou nada ao meio-dia

E eu que era tudo ou nada ao meio-dia,

Que cantava a chuva ao inverno frio,

Que rastejava seu nome aos pés do caos,

Que andava só e nua

Sob o sol da minha rua.

Eu que amei a todos enquanto contemplava a vida,

Que odiei o vento sul nas tardes de sábado,

Que lamentei a morte e celebrei a vida,

Que troquei tantos sonhos por livros preciosos,

Que andava a pé, à toa,

Sob a lua do meu tempo inútil.

Eu que praguejei injúrias na sexta-feira treze,

Que amaldiçoei a falta de sorte do mundo,

E invejei meninas de cabelos dourados,

Durmo hoje ao som de eternas rumbas,

Uso vermelho às seis da manhã,

E ando de preto,

Sob o sol do meu destino.

Eu que nunca lamentei meus absurdos,

Que nunca retrocedi nos meus conceitos rígidos,

Que de certezas plenas amanheci em verdes vales,

Que escutei o ai solene de prostitutas virgens,

E derramei meu sangue ainda criança,

Ando hoje devagar,

Sob a lua cheia de histórias vermelhas.

E hoje aqui tudo é lembrança e esquecimento,

Minha casa é pequena pra mim,

E meus amigos já não dizem as letras do meu nome estéril.

Faço da rua abaixo passarela extensa

E ando ainda sem pressa

Sob o sol e a lua do meu caminho vil.