MARIANA
Ela abriu a janela e olhou o horizonte distante
No meio daquele deserto, a terra tinha sede de chuva
E a plantação morta tinha fome do fogo depurador.
Uma lágrima caiu do olho verde cheio de tristeza
Enquanto o sol continuava a beber os rios,
Os poços, os açudes e todas as lágrimas que resistiam.
Vendo o céu mais implacável que o próprio inferno
E sabendo que a fome era como uma fera
Que devorava primeiro os enfermos, depois os fracos
Para em seguida enlouquecer o que sobrou dos fortes,
Mariana lembrou-se que havia sepultado Flávio anos atrás
E junto dele, sepultou também os sonhos.
Abrindo a porta, iniciou sua marcha até o poço:
O único poço que ainda não secara e que continha água
(não era água, mas um fluído de barro salgado).
Encheu um jarro com aquela água espessa, salobra.
Pôs sobre a cabeça e voltou para sua casa.
Chegou à porta tremendo e o peso da vida a fez cair.
O sol, a fome, a sede e o cansaço secaram os seus olhos.
Mariana não pode mais nada ver.
Na soleira da porta da velha casa,
Caída como um trapo que o vento arranca do varal
Com os braços abertos como a implorar abrigo
Fez uma oração muito antiga
E a morte decepou-lhe o pouco que restava de vida
Antes que pudesse finalmente dizer
Amém.