CHÃO DA LITERATURA**

Sou a alma desvairada

que reanima e recicla abandonos.

Sou o vale que recolhe águas barrentas,

seus cacos e restos

trazidos pela correnteza da vida.

No chão da literatura,

recolho tudo o que se rejeita:

vielas e becos, crianças sem pátria dos faróis,

pés descalços, sertão...

e nossos heróis derrotados:

Che Guevara, Conselheiro, Prestes, Lampião...

Aparo todas as sobras,

lustro com kaol

as palavras malditas,

dos poemas esquecidos,

dos livros que a crítica ignora,

que o mercado rejeita

e o intelectual perjura.

Sou o catador de ferro-velho

que retira vida do limbo,

do quase nada.

Sou do território dos excluídos,

periferia, marginália, Brasilândia...

Canto histórias esquecidas,

sons quietos dos que foram calados.

São matérias-vida que recolho

no chão-abrigo dos indigentes,

dos asilados, migrantes,

dos loucos e suas mazelas.

Acolho ultrajes à arte imaculada,

às escolas e panelas literárias.

Exalto os músicos da noite

e os poetas de verso torto e pé quebrado.

Sou a palavra rejeitada

caída da mesa farta dos poetas letrados.

......

ARQUIVO MORTO

Seu amor me ampara e me dá forças

Às vezes quando chego mais cedo da labuta

Cheiro tua roupa guardada

Suas peças íntimas sobre a cama

E me vêm o seu sexo inteira

O teu calor me toma e tenho teu corpo nu assim na mão

Quando me chama para o teu íntimo

Depois da janta

E me vem com teu cheiro de perfume

Com todo o teu furor

Esqueço do cansaço

Do aço do dia

No teu ninho reencontro a esperança

Na tua pele

Nos teus flancos umedecidos

O fogo pra minha luta

Que me empresta e me dá alento para a seguinte labuta

Seu sexo fica em mim nas ventas

Me acompanha no dia, seu cheiro fica dentro

Teu corpo ao me trancar me liberta

E me põe de pé

Lembro da tua voz na noite

Como me soa matinal, infantil e verdadeira

A tua mão leve quando me procura

E me toca e roça meus pêlos

Você é meu zelo, luz e apego

Mesmo quando o sono é maior que o desejo

O teu calor cola em mim e me alenta

Fico acordado

Ancorado em teu corpo

E assim me perco em divagações

Vendo a nudez rígida dos teus traços

Toco a tua carne dura e me faço teso

Seu seio rijo me mostra a tua força

A energia que emanas quando me dá do teu bom

Você é minha

Parte

A que me falta e completa