TRIVIAIS DE INVERNO

“A fulva neblina que roça na vidraça suas espáduas”

(T.S. Eliot)

A manhã vai cerrada pela neblina

Nos lábios fechados de uma donzela branca.

E que tristeza...

Mas eu sei que o sol virá

A galope, no cavalo de Dom Juan.

Virá pomposo e discreto

Sobre o dorso deste alado quadrúpede

E penetrará, sutil, as entranhas

Da cinzenta infância deste dia.

Começará pelas fendas pequenas

Que intercalam os picos das altas montanhas,

Descerá os penhascos traiçoeiros

Enganando-os com um sussurro ligeiro,

Pisará a agudeza dos cristais sem despertá-los

E do urso feroz acalmará o urro

Na frieza de um beijo atroz!

Envergar-se-á na curvatura maleável

Dos altos pinheiros

E atingirá o estrume imundo

De um chiqueiro.

Depois, com a violência de um esfomeado,

Fecundará o profundo destes vales

Até deixá-los estafados

Do extasiante gozo da vida.

Gil Guimarães
Enviado por Gil Guimarães em 06/09/2010
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