poema de ano novo
é preciso perdoar.
perdoar e esquecer.
perdoar e dar uma nova chance;
— o mundo são novas chances, sempre,
porque errar é constante,
diário.
esquecer simplesmente é pouco.
— nada se esquece, jamais; as coisas
têm o dom
de permanecer em nós.
a inquietude do mundo
fica,
como clave,
em cada
ato.
a memória o faz existir.
a intensidade com que se faz em nós (somente em nós)
o perpetra.
mas a nada de nós dá-se o dom de existir não seja
mediante a nossa existência,
a existência das coisas através de nós, que nos transpassam.
a existência dos fatos mediante a interpretação que
fazemos deles, intensa
e profundamente,
o quanto os fizermos eles. e tudo isso não se esquece só,
jamais.
a não ser que se cure,
quando é mal
e se perdoa. a não ser que se perdoe,
quando machuca e não há cura.
é preciso perdoar
e esquecer
e não somente saber disso,
mas interiorizá-lo como uma verdade que nos fará bem, a nós,
que nos fará completos enquanto homens,
que nos arrancará da ignorância:
é a mágoa e o rancor que nos fazem infelizes, dia a dia;
é pensar na dor e no mal e insistir demais neles que nos faz
passar nossas datas
tristes, nossos aniversários sem ânimo;
é o lembrar das lembranças ruins que nos faz cada vez
mais velhos,
que nos traz cada vez mais rugas:
tente perdoar e esquecer,
a própria pele rejuvenesce.
primeiro no nosso espelho,
depois no espelho que vemos nos olhos dos outros.
tente e perceba!
todo mundo quer ser perdoado,
até os maus, — e ninguém é mau que não seja idêntico a nós!
eu peço ser perdoado,
por favor! me perdoa! é que temos andado com o pensamento louco
sem saber,
sem distinguir direito o que é bacana e o que é chato,
— afinal, se demora um pouco para aprender cada coisa...
(eu agora nos meus trinta anos e
talvez eu morra e não saiba direito de nada!)
mas quem sabe se fores capaz de me perdoar
eu não curvo a minha cabeça e te agradeço? e eu aprendo?
no começo quererei ainda te culpar por tudo,
mas passado algum tempo sentirei o quanto é bom
ser perdoado, quem sabe?
engolirei o orgulho e pedirei também perdão.
reconhecido o meu ato e tu também, reconhecido o teu,
estaremos mais leves amanhã.
e no túmulo quando nos deitarmos estaremos
ambos
lado a lado com as promessas de
Céu e de Deus,
estaremos absolutamente crentes e
em paz.
portanto,
é preciso perdoar,
é preciso esquecer,
— o mal do mundo é faltar co’esse simples compromisso.
e assim, enfim, te desejo por isso:
perdoar e esquecer,
para que eu possa aprendê-lo
contigo.
do livro "telúreo canto": http://www.recantodasletras.com.br/e-livros/4068568 (e-book) ou http://andreboniatti.wix.com/dialogopoetico#!livros/c14e3 (versão impressa)