me sinto

me sinto, aqui, tão no escuro de mim,

embora claro,

embora impavidamente claro,

absurdamente, — ao ponto de ser transparente,

ao ponto de ser doente,

ao ponto de não ser

gente —,

embora caucasiano branco sem nenhuma identidade ou religião,

exposto “in vitro”, em oferta, na vitrine do mercado

de escravos, comercializado em face à internet e à globalização.

me sinto, aqui, tão sem razão.

sem pra que continuar no mundo,

embora amarrado.

me sinto pelado e constantemente envergonhado,

cuspido e insultado,

embora nitidamente forte.

sem nenhum norte, embora cheio de dons e graça.

eu me sinto na praça, no centro da arena,

no meio entre leões; e a plateia, embora linda,

lança pedras.

— embora nunca ninguém me acerte,

mas meu corpo está cheio de arranhões.