Ferlingheti, Gullar, Whitman, juntos e misturados

O poeta não é sacerdote

Está mais para guerreiro

Por isso não permite

Que a fraqueza o tome

E domine o seu coração.

Não lhe é próprio, não é seu

O abandono da luta

A omissão na batalha

É um vencedor de inimigos

Um demolidor de demônios

Com sua música forte vêm

Com sua corneta e seu tambor

E não toca só o hino do vencedor

Toca pelos derrotados

Pelos abatidos e assassinados

Por isso grita e concita a todos

Com seu canto, com seu verso:

Que passe para trás

Quem se acha na frente

Que passe para frente

Que está lá atrás

Que os doidos, os apaixonados

Os sujeitos mal-comportados

Encaminhem propostas

Que sejam postas de lado

As velhas proposições

Que se cantem as novas canções

A poesia não é igreja

Não é expressão secreta

Algo que se fecha em templos

em cátedras

Ladainhas já não servem

É hora de dizer palavras novas

É hora de abrir as bocas

A poesia está morta. Viva a poesia!

Por isso a poesia grita

E concita a todos:

Não esperem chegar a revolução

Senão ela chega sem você

Saiam já da sua toca agora

Da sua torre de marfim

Abram suas janelas, as suas portas

Que todos saiam de suas vidas estanques

As árvores continuam a tombar

E às matas não vamos mais

Não há tempo de entrar nelas

Que ardem por força do capital

Por isso a poesia grita

e concita a todos:

Desçam de seus apartamentos

e venham às ruas do mundo

Abram os olhos e mentes

Falem de amor e de dor

Quem fala de amor diz tudo

Quem fala de dor diz mais

A poesia se torna muda

Sem as palavras reais

No dicionário a palavra

É mera idéia abstrata

Mas pode ser arma que fere e mata

E o poeta não é sacerdote

Está mais para guerreiro

Por isso não permite

Que a fraqueza o tome

E domine o seu coração.

Poema engendrado com textos de

L. Ferlingheti, Ferreira Gullar e W. Whitman