A casa da mãe Joana

Menino eu não entendia a casa da mãe Joana

No fim todos iam dar lá

De sacada na rua esquina da Aguiar

E fundos no beco da Sorocabana

Da minha janela via todo dia

Os que entravam cabisbaixos

Fatigados da lida tão maçada

E que saíam a estocar bengalas na calçada

Que diabos no sobrado havia?

Era um entra e sai de gente que subia

Sempre de noite e de dia

Com sol ou quando a chuva caía

Mãe Joana hospedava lá umas moçinhas

Que ela dizia serem sobrinhas, tão novinhas

De dia nos afazeres da casa

E de noite de batom sempre arrumadas

De tarde no terraço espiavam o movimento

Aguardavam na função logo à noite os vis momentos

Enquanto iam carros e pessoas alheios pela rua

Que nunca as viam se aprontando quase nuas

A mãe Joana devia mesmo saber das coisas

Mulher de haveres dava nó em pingo d´água

Sabia histórias do arco da velha que contava na moita

E sempre levava as notas na anágua

Homens e bengalas surgiam quietos

Já eram velhos, tinham até netos

E só subiam na casa da mãe Joana

Através das portas pesadas no beco da Sorocabana

Certa noite houve um pandemônio

Chegou à casa a esposa do seu Antônio

Homem velho de bigode risonho

Que vivia enxovalhado, sujeito estranho

Queria saber do marido

Há dias não via o desenxabido

A Mãe Joana correu na porta

A dar desculpas meio tortas

A mulher não engoliu

E mandou a velha a favas que a pariu

- Onde está o Antônio?

Soltou aos gritos com uma voz de ódio

- O que estaria fazendo aqui o seu marido?

Disse mãe Joana a responder o descabido

Sem saber o que fazer com a senhora

Que esbravejava de raiva à sua porta

Fugiram sem terno os homens pelo beco lá nos fundos

Sem bengalas despencaram loucos para fora quase nus

Com as raparigas logo atrás a gritar:

- Chama lá Seu Zé o capataz – eles saíram sem pagar!

Era quase meio da noite

E Seu Antônio estava já longe

A esposa nada encontrou

E a mãe Joana inda lhe ralhou

Contavam-se casos da cidade ouriçar

Enchiam os dias na casa da mãe Joana

De sacada na rua esquina da Aguiar

E fundos no beco da Sorocabana.

Fábio Pirajá
Enviado por Fábio Pirajá em 09/01/2008
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