Catavento

Ainda gosto de pensar em ti,

Se bem que te lembrar 'inda me doa tanto...

E ainda gosto de sentir-te aqui,

Por mais que esta lembrança me provoque o pranto.

Mas gosto de pensar que ainda te tenho,

Por mais que eu reconheça a fantasia.

Pensar em ti me traz afago à alma,

Gozar-te inteira, em sonho, me extasia!

E quando, neste sonho, em ti me atenho,

Eu posso te beijar

E acariciar teu senho

Percorrer com os dedos todos os teus traços,

Como tanto te fiz,

E apertar-te em meu peito...

Como é bom rever-me no teu leito,

Como é bom lembrar-te nos meus braços.

Traz-me alento ver-te no meu carro

Ao deixar-te assim, meio sem jeito,

Ao beijar num instante a tua mão.

E eu sorria do inocente sarro

Tal qual travessura de um mal-feito

Que tão bem fazia ao coração.

Fiz do meu lembrar tão grande alento

Que, na imensa noite de saudade,

Veio a se tornar todo o meu sol.

Vejo em ti meu doce catavento

E mergulho em tal felicidade

Ao me imaginar teu girassol.

Somos, tu e eu, qual noite e dia...

Água eu sou enquanto tu és terra.

És concretude, eu sou só fantasia,

Somos um a Paz, o outro a Guerra.

Mas eis que do universo vem a ajuda:

Ainda em que de opostos se consista

E estes não se encontrem, nada muda:

Porquanto um só é

Enquanto o outro exista.

Ah! Que falta tua eu sinto nas entranhas...

Do teu sorrir, do teu olhar,

E até das tuas manhas...

Como deixaste imenso este vazio

E no meu corpo inteiro esta impressão de frio

Que não é aplacado por nenhum calor

E que me põe prostrado,

Inerte,

Incapacitado

Prá separar tal dor de amor,

Por mais que esta razão me cobre...

E que me ponha na mediocridade

De uma rima pobre...

E tudo se mistura na paixão aguda

Que só faz sufocar-me nesta angústia muda

Que não aceita ajuda prá se dissipar.

Não quer deixar jamais que eu te esqueça,

Nem perguntar também se eu o mereça

Do coração pra sempre te arrancar.

Sofro com a desesperança

Ao deixar livre a lembrança

Que não posso reprimir.

Mas ao mesmo tempo ainda quero

Lembrar de ti, e te venero

Neste sofrido sentir.

Este sofrer me alimenta

Pois é o que de ti retenho

Que não me podes tirar

E esta paixão me testa...

Pois é o que hoje resta

Da fome de te amar.

Luiz Roberto Bodstein
Enviado por Luiz Roberto Bodstein em 02/07/2006
Reeditado em 13/02/2012
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