EM SÃO PAULO TEM APOCALIPSE TODO DIA

Que venha a chuva ácida e inunde esse deserto concreto

Essa imprecisa fila de carros

Essa nuvem de fuligem no ar

Que ladre o cão/ fira a tarde/ morda a cauda

Que seja torto nosso destino/ desatino nessa cidade.

Onde moro não falta cataclismo!

Que me venham as rimas todas sem travas

Palavras tortas/ pensamento incerto/ cisma/ invocação/ aflição

Preciso dizer o que penso e o que penamos aqui:

Bombas explodem/ PCC no ataque/ alarde/ alerta máximo!

Que o rio continue seu choro de podridão e seu ácido líquido escorra

Onde eu moro o rio foge do mar!

Que se finde tudo toda tarde/ não se esqueça/ tudo inunda aqui

A morte não morre/ não há conserto/ socorro!

Nada parece deter nosso caos/ nosso mal

Ferida que se alastra/ e não param de jogar sal

Garrafa pet nos rios/ favelas sob as pontes/ crianças nos faróis...

Nós que não desatam.

Não pára o desembarque/ o achaque/ o saque.

Onde eu moro miséria abunda pelos poros

Que venha a 25ª hora a hora/ agora ou daqui a pouco

Algo se aclare/ me acalme/ dissipe as nuvens/ ou me rache ao meio

Que chegue a chuva agora/ fartura de águas

Ou mais à noite

Na cidade em que vivo tem apocalipse todo dia