MINHA ÚLTIMA ORAÇÃO
Deus, eu que sou o esboço de um protozoário
A penugem morta de um abutre
A fragrância torpe de um cadáver
A secreção escura da ferida.
Deus, eu que de verdade tenho só essas palavras
Que não valho o chão que o porco pisa
Que não sirvo de adubo nem para as pragas
Que sou a sílaba tônica da mentira
Deus, eu que te reneguei por mais do que três vezes
Que sei dos meus pecados, mas zelo por eles
Que gosto da luxúria, da promiscuidade
Que faço anedotas com a minha própria dor e miséria
Deus, é esse micro ser que não deveria dirigir-lhe o pensamento
Que te implora por consolo, que grita em tom de apelo
Para que não me olhe, mesmo de relance
Para que me escute quando não houver nada mais importante para fazer
Para que me conceda o perdão por compaixão a um ser como eu, desprovida de espírito.
Deus, se eu não estiver sendo muito indiscreta
Peço que as minhas orações passem do teto
E que haja luz na minha escuridão vil
E que haja paz que meu peito jamais viu
E que ao fim da minha jornada
Ainda que cega, eu veja a tua glória
Ainda que muda, eu cante o teu amor
Ainda que surda, eu escute a tua voz
E ainda que morta, eu viva o esplendor da salvação,
Se houver!!
Somente se houver, uma para isto o que sou:
Uma excrescência Humana!!