agradeço a deus

agradeço a deus,

porque não compreendo o funcionamento

do meu corpo,

nem por isso o meu corpo

deixa de compreender

o funcionamento perfeito de si mesmo,

agradeço a deus,

porque existe um silêncio

ao torno de mim,

que eu escuto,

muito embora nada dele eu compreenda,

e nele há coisas

como ao sonho mudo e desnudo de um feto no feto,

agradeço a deus,

porque na solidão absoluta

há um ser que interroga,

pouco importando a resposta,

a imensidade do mundo

que segue ao desmundo

e que é pequeno

e que cabe na palma da mão,

agradeço a deus,

não quero nada além do sonho,

porque há um sonho

e nele uma esperança

como fosse uma criança

que diria

“é tudo simples,

como quando eu sorrio,

se o barquinho de papel que se amassou

não recupera,

tem folhas brancas no caderno a preencher”,

agradeço a deus,

porque o tempo é uma máquina

tal soberba

que tem o poder de atrair

e afastar

e de fazer nascer do absurdo

raízes prenhes de frutos

e a corpulência maciça

do presente,

agradeço a deus,

porque o vizinho existe, porque o sereno existe, por causa do céu,

porque o céu tem dez mil estrelas

que nunca pude contar

e porque

para cada uma delas há dez mil céus diferentes do meu

no entanto

todos tamanhos

que infinitude seria palavra pequena de dizer,

agradeço a deus,

depois queria

agradecer a deus

por qualquer coisa

que não tenha

nada a ver,

pois deus,

surdamente,

ouve em mim mesmo

o muito

que eu não sei.

andré boniatti
Enviado por andré boniatti em 13/07/2006
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