RETORNEI AO PASSADO
Retornei a um passado distante,
voltando à infância e logo eu vi
aquela figura de um pequeno menino,
andando sozinho, trilhando um caminho.
Com pés descalços e dorso desnudo,
com olhos vivazes, sonhos profundos.
Seguindo uma trilha entre dois mundos,
tantas vezes usada e também percorrida.
Perante o ladrão do antigo açude,
vislumbro a parede de terra socada.
Uma obra de homens tenazes, valentes,
que suporta todo o peso da água parada.
Diante da cena que é vista, olhada,
relembro detalhes da vida passada.
Da criança que lembra e relembra,
objetos parados, perdidos, esquecidos.
O tempo é um carrasco cruel,
que nada perdoa, destrói e renova.
Gerações que se vão, mas que renascem
nas eternas esperanças de uma criança.
Reinicio o caminho tantas vezes trilhado,
no distante passado,em tempo afastado.
Voltam-me à mente o que havia esquecido,
detalhes de coisas que talvez nem mais existam.
Olhando à esquerda de onde me encontro,
vislumbro todo um mar, de água parada.
À minha direita a ladeira escorregadia,
às vezes me assusto com a travessia.
Logo após o início, um velho coqueiro,
há muito curvado pelo peso do tempo,
ainda insiste em dar os seus frutos,
à esquerda, toda a água, é o sustento.
Seguindo atento a todas as lembranças
de quando criança prossigo em frente.
O som, o barulho de um coco que cai,
tira-me a atenção e logo me atrai.
A gravioleira já velha, lá estava,
com copa enorme e frutos pendentes,
um convite constante aos transeuntes,
idosos, adultos e até adolescentes.
Com passos precisos sigo em frente,
olhando tudo que há parado por ora.
Relembro o cheiro da fruta madura,
que lá se encontra para ser recolhida.
Um pouco à frente os canos gelados,
a passagem da água que subia e descia,
um mistério da vida e do conhecimento,
só pode entender quem vê no momento.
O leve ruído da água que passa e cai,
me leva bem longe em dias passados.
Quando era criança, deitava e ouvia,
lembranças suaves, perdidas no tempo.
A ave que voa passando por mim,
seu canto destoa enquanto espero.
Sobrevoa cantando e tentando assim
afastar-me do ninho de um quero-quero.
Prossigo a jornada atento a tudo,
sobre a parede do grande açude,
do lado esquerdo a água parada,
do outro lado todo verde se expande.
Observo atento qualquer movimento,
dos peixes nadando e pássaros cantando.
bem perto de mim, à frente diviso o caminho;
a terra bem quent, queima os pés do menino.
Deslizo suave rumo à água parada
eu coloco os pés na água gelada.
Eu sinto a preguiça que me toma de assalto
e, com sobressalto, vejo uma cobra passar.
Levanto-me e corro, fugindo com medo,
um leve arrepio perpassa meu corpo.
Um medo insano, o medo do nada,
do pequeno réptil, que foge de mim.
Levanto-me atento a tudo que passa,
na rota que não pode ser desviada.
Seguindo eu continuo, sentindo o medo,
procuro num galho jogado a minha coragem.
A sombra abundante do pé de tamarindo,
alto e imponente está sempre à espera,
que venham colher seus frutos caídos,
que jazem pelo chão maduro e azedo.
O simples pensar saliva minha boca,
degusto o fruto, com cara bem feia,
o medo se fora ficara para traz,
me sento no chão pra repousar.
À minha direita o grande casario,
que há muito servira de tosco engenho,
teima em ficar pra lutar contra o tempo
e doces lembranças animam minha alma.
Passando momentos naquela madorna,
olho distante a casa, além da porteira,
que há muito abrigara meu avô paterno,
um avô que se fora, bem antes de mim.
Agora passado tanto tempo depois,
voltam-me as lembranças e recordações
de quando criança, ainda inconsciente,
do que me reservara o tempo presente.
Precisei de um tempo para recordar
lembranças tão doces, suaves,amenas.
Agora, no entanto, quando relembro apenas,
parte do meu passado, que agora é relembrado.
EM- 05/04/02